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Emília anula licitação de transporte por conta de gravíssimas irregulares, mas veta proteção de trabalhadores

Prefeita acerta na anulação da licitação, mas erra ao vetar proteção aos trabalhadores (Crédito: Secom/PMA)

Um caminho sem volta: a licitação do transporte público em Aracaju foi anulada pela prefeita Emília Corrêa (PL) por conter gravíssimas irregularidades que já haviam sido apontadas pelo Ministério Público de Sergipe (MPSE) e pelo Tribunal de Conta do Estado (TCE-SE). A Mangue Jornalismo também mostrou em várias reportagens as ilegalidades da licitação realizada no final da gestão do prefeito Edvaldo Nogueira (PDT). Leia as reportagens edital lançado às cegas e licitação sob suspeita.

Segundo os órgãos de controle, a licitação apresenta violações de normas financeiras, não cumpriu obrigações de responsabilidade fiscal e do direito administrativo, além de terem sido encontrados fortes indícios de direcionamento e de superfaturamento. Não foram verificados princípios de transparência, economicidade e participação popular.

“Essa licitação vai ser anulada, mas com responsabilidade, com compromisso de, no prazo de seis meses após esse procedimento, realizarmos um novo processo licitatório. Além disso, vamos dar um prazo de 60 dias para que as empresas, esses três lotes que estão aí atualmente, se reestruturem, se reequilibrem, para que não gerem nenhum tipo de problema para a população”, garantiu Emília, que também anunciou que a tarifa vai continuar em R$ 4,50 este ano.

Contraditoriamente, a prefeita que promete nova licitação para um transporte de qualidade vetou um projeto de lei aprovado na Câmara de Vereadores de Aracaju, que condicionava o repasse de mais de R$ 100 milhões de verbas públicas (subsídio) para os empresários do transporte ao cumprimento das obrigações trabalhistas e ao fornecimento de um serviço seguro e de qualidade. Veja abaixo.

Edvaldo Nogueira foi multado em R$ 30 mil por irregularidades

No dia 12 de dezembro, o então prefeito Edvaldo Nogueira chegou a ser multado em R$ 30 mil por decisão unânime do TCE-SE em razão das inúmeras irregularidades exatamente na licitação do transporte público. A decisão foi fundamentada com o relatório detalhado da 6ª Coordenadoria de Controle e Inspeção e do parecer do Ministério Público de Contas.

Edvaldo foi multado em R$ 30 mil por irregularidades na licitação (Crédito Secom/PMA)

A conselheira do TCE-SE Angélica Guimarães, relatora da decisão, afirmou que a licitação não previu orçamento necessário para custear o subsídio tarifário, estimado em R$ 126 milhões anuais nem as despesas operacionais do Consórcio do Transporte Metropolitano. Ela também apontou ausência de critérios contábeis para a avaliação econômico-financeira, deixando de incluir itens mínimos para os licitantes, e inconsistências nos valores do índice que impactam no cálculo da passagem.

A ação do MPSE e as decisões do TCE-SE, com multa ao ex-prefeito, foram os parâmetros usados pela prefeita para anular a atual licitação. Emília disse que a nova concorrência para o serviço de transporte “será conduzida com maior transparência, incluindo participação popular. Vamos corrigir as falhas do processo anterior. Vamos correr atrás para, em seis meses, a gente estar concluindo uma nova licitação que atenda aos usuários com linhas adequadas e com preço justo”, garantiu.

Até a nova licitação, que dificilmente será concluída em seis meses como prevê a prefeita, o serviço de transporte de Aracaju continuará como sempre, com uma autorização precária que se estende por mais de 25 anos e de péssima qualidade, como também já revelou a Mangue Jornalismo. Leia a reportagem Transporte em Aracaju tem ônibus caindo aos pedaços, incendiando e causando acidentes. Prefeitura diz que não permite a circulação de veículos danificados.

“Emília mantém as mesmas empresas de ônibus nos próximos meses, confiando que elas vão melhorar os serviços. É desse jeito, população de Aracaju e dos demais municípios, que uma gestora cede mais uma vez para o grande empresariado. Não foi por falta de aviso!”, disse a vereadora Sônia Meire (PSOL) nas redes sociais.

Emília veta projeto que garantia proteção aos trabalhadores do transporte

A prefeita de Aracaju prometeu que a nova licitação do transporte será transparente e que deve proporcionar um serviço de qualidade. Entretanto, de forma contraditória, ela vetou um projeto de lei aprovado na câmara de vereadores que protegia exatamente os trabalhadores do transporte público.

Em 30 de novembro de 2023, os vereadores de Aracaju aprovaram o Projeto de Lei nº 415/2023, que autorizava, provisoriamente, a concessão de subsídio tarifário para os serviços públicos de transporte coletivo urbano em Aracaju. Os valores desse rombo público em benefício dos empresários foi estimado em R$ 24 milhões, apenas cobrindo o período de outubro de 2023 a dezembro de 2024.

Ocorre que muitas empresas do transporte público são acusadas de não respeitar os mínimos direitos dos trabalhadores. Muitos deles passam meses com salários atrasado, há denúncias de falta de pagamento de tíquete-alimentação, férias, 13º salário, além de péssimas condições de trabalho. A Mangue Jornalismo também já trouxe esse tema. Leia a reportagem Demitidos em massa e excluídos de edital do transporte público, ex-cobradores enfrentam desemprego enquanto motoristas exercem múltiplas funções.

Ônibus pega fogo: insegurança para usuários e trabalhadores (Crédito: Redes Sociais)

Diante desse quadro, o vereador Camilo Daniel (PT) apresentou um projeto que condiciona a liberação de verbas públicas ao transporte público coletivo, a partir do cumprimento de obrigações de cunho trabalhista ao setor rodoviário e ao provimento de condições mínimas de segurança da frota.

No dia 10 de dezembro passado, os vereadores aprovaram por unanimidade o Projeto de Lei nº 142/2024, que institui condições para o recebimento dos milionários subsídios pelas empresas ao cumprimento por elas de todas os direitos trabalhistas. O projeto seguiu para sanção da prefeita Emília Corrêa e ela vetou. Importante destacar que o então vereador Ricardo Marques (Cidadania), hoje vice-prefeito, aprovou o projeto, junto com o vereador Isac Silveira (União), atual líder da prefeita na câmara.

“A prefeita alegou que o projeto é inconstitucional, mas ele foi aprovado pelas comissões de justiça e transporte da câmara e por unanimidade dos vereadores. Pagar salário em dia é inconstitucional? Ter transporte de qualidade é inconstitucional? É necessário que a câmara de vereadores derrube o veto da prefeita e que dê dignidade para os trabalhadores e usuários do transporte público de Aracaju”, afirmou o vereador Camilo Daniel.

Camilo Daniel espera que vereadores derrubem o veto (Crédito: CMA)

MPT-SE entrou com ação contra prefeitura por não proteger trabalhadores

Em breve, a Prefeitura de Aracaju poderá ser condenada na Justiça do Trabalho exatamente por não fiscalizar as empresas de transporte público e sua relação com os trabalhadores do setor. O Ministério Público do Trabalho (MPT-SE) ajuizou uma ação civil pública para que a prefeitura e a SMTT sejam responsabilizadas pela ilicitude na forma de contratação das empresas de transporte coletivo e pela ausência de fiscalização na prestação dos serviços, dos pontos de vista trabalhista e fundiário.

A ação foi motivada pela omissão da Prefeitura de Aracaju diante dos sucessivos atrasos salariais praticados pelas empresas de transporte coletivo, além do não pagamento de outros direitos, como FGTS, férias e décimo terceiro. Ao longo dos últimos anos, milhares de ações individuais já foram ajuizadas por trabalhadores contra as empresas que atuam no transporte coletivo de Aracaju e região metropolitana.

Na ação, o procurador-chefe e titular do 9º Ofício no MPT-SE, Márcio Amazonas, destaca que o poder público municipal nunca tomou providência administrativa efetiva para regular o serviço público de transporte coletivo no âmbito do município e ainda financia a atividade. Trata-se de “um crônico problema e um grave prejuízo social causado pelos ilícitos que vitimam centenas de trabalhadores das empresas rés e suas famílias”, afirmou o procurador.

O MPT-SE pede aplicação de multa de R$ 300 mil e a condenação ao pagamento de indenização pelo dano moral coletivo no valor de R$ 1 milhão. A ação foi ajuizada na 3ª Vara da Justiça do Trabalho, sob o números 0001436-65.2024.5.20.0003.

Caos no serviço de transporte público ainda deve permanecer (Crédito: Redes Sociais)

Empresas devem recorrer da decisão da prefeita

Em nota, o Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros do Município de Aracaju (Setransp) afirmou que as empresas vencedoras da licitação do transporte público deverão recorrer da anulação do edital anunciada pela prefeita Emília Corrêa. Segundo o sindicato, “as empresas de transporte que ganharam a disputa no processo licitatório, e já se preparavam desde o ano passado com a compra de ônibus e contratações para iniciar a operação este ano, deverão recorrer dos direitos ao contrato firmado em 2024”.

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