Pesquisar
Close this search box.

População em situação de rua não é prioridade nos planos dos candidatos à Prefeitura de Aracaju

“A gente quer sair da rua, ter emprego e moradia”, diz Carlos Roberto Lima, 46 anos, que é uma das mais de mil pessoas em situação de rua em Aracaju. Infelizmente, a depender dos planos de governo da maioria das(os) candidatas(os) à Prefeitura de Aracaju, essa situação não deve mudar. A promessa geral é cuidar de modo assistencial, mas não resolver o problema.

População em situação de rua em Aracaju não é prioridade da maioria dos candidatos. Foto: Anderson Barbosa.

“A gente quer sair da rua, ter emprego e moradia, é disso que a gente mais precisa”, afirma Carlos Roberto Lima, 46 anos. Ele é uma das 1.056 pessoas em situação de rua que, segundo o Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua, vivem na capital de Sergipe e desejam mais respeito aos seus direitos, a começar, saindo das ruas.

A Mangue Jornalismo já publicou uma série de reportagens que revelam por exemplo, que Sergipe é o 4º estado no Nordeste em violações contra pessoas em situação de rua; a situação dos idosos em situação de rua; como crianças em situação de rua sobrevivem na capital; e a grave invisibilização morador em situação de rua em Aracaju.

Diferentemente de boa parte das pessoas vivendo em situação de rua, Carlos Roberto está documentado e com o título eleitoral pronto para se apresentar no dia 6 de outubro, data reservada ao 1º turno das eleições municipais. Na urna eletrônica, ele terá que escolher um entre sete candidatos que disputam a chefia da administração da Prefeitura de Aracaju. A chapa dos candidatos do PCO foi indeferida por pelo Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe (TRE/SE) por falta de documentação.

Segundo o TRE/SE, a capital tem mais de 416 mil eleitores aptos ao exercício da cidadania, mas o órgão não soube informar quantos estão em situação de rua, mas com documentação em dia para votar no pleito de outubro.

A participação dessas pessoas no processo eleitoral ainda causa surpresa em muita gente, reflexo da exclusão histórica que invisibiliza a existência delas e dificulta, por exemplo, o acesso a serviços de emissão de documentos fundamentais para receber benefícios sociais e exercer o direito ao voto. No Brasil, para ser eleitor é necessário ter pelo menos 16 anos no dia da eleição, após ter passado pelo processo de alistamento eleitoral.

A população em situação de rua no Brasil possui inúmeras leis com boas intenções e que deveriam ser conhecidas pelos candidatos que disputam uma das vagas no Executivo e Legislativo municipal. Entretanto, quando se observa os planos de governo registrados no site do TRE/SE, percebe-se a falta de prioridade para essa população.

O Decreto Federal n° 7.053 de 2009, por exemplo, determina urgência nas políticas públicas para as pessoas em situação de rua, mas o que se observa nas sete candidaturas são promessas rasas, sem aprofundamento às necessidades dos que estão em situação de rua.

A maioria dos candidatos cita as ações ou políticas públicas que serão executadas ao longo dos quatro anos de mandato, mas esquece de mostrar como essas propostas podem de fato sair do papel e virar ações. A forma rasa como as temáticas ligadas à população em situação de rua é apresentada mostra a falta de conhecimento sobre as necessidades desse grupo social.

Luiz Carlos vive exclusivamente das doações. Foto: Anderson Barbosa.

Primeiros dados do censo

A Primeira Etapa do Censo da População de Rua do Município de Aracaju ocorreu entre os dias 03 e 05 de setembro. Naqueles dias, toda uma equipe de recenseadores foi às ruas da cidade no período entre as 22h da noite e 04h da manhã com o intuito de fazer o levantamento e produção de dados sobre as pessoas em situação de rua na capital.

Os primeiros dados revelaram que a maioria da população em situação de rua de Aracaju é composta por pessoas negras (aproximadamente 75%) e que estão em situação de rua há cinco anos ou mais (aproximadamente 40%). Dentre esta caracterização preliminar, identificou-se que a maior parte desta população é composta por homens cisgênero, seguidos pelas mulheres cisgênero em percentuais de aproximadamente 80% e 14% respectivamente.

O censo foi realizado por pessoas do Movimento Nacional da População em Situação de Rua-SE (MNPR-SE), da Pastoral do Povo da Rua, da Associação Católica Bom Pastor, da Universidade Federal de Sergipe (UFS), profissionais dos equipamentos da Saúde e da Assistência Social da prefeitura de Aracaju.

A seguir, veja um resumo das propostas das(os) candidatas(os) à Prefeitura de Aracaju para enfrentar o problema da população em situação de rua. As promessas estão nos planos de governo que são públicos e podem ser acessados diretamente no site do TRE/SE.

CANDISSE CARVALHO (PT)

(Foto: TRE/SE)

O plano de governo da candidata cita sete vezes o termo população em situação de rua. Ela não esclarece como as ações serão executadas e, em algumas situações, parece englobar esse grupo populacional entre os “mais vulneráveis”, exigindo ainda mais detalhes de como será a execução e respeito a heterogeneidade dessa massa de cidadãos/eleitores. A candidata cita a criação das “Cozinhas solidárias em áreas com alta insegurança alimentar no projeto ‘Aracaju Sem Fome’, especialmente nas localidades onde concentram população em situação de rua; a “ampliação de programas e locais de acolhimento e proteção para a população em situação de rua, bem como a implementação para pessoas idosas e para a população LGBTQIA+”; a reestruturação do CRAS, o CREAS e Centros POP; e a implementação do Programa Consultório na Rua.

DELEGADA DANIELLE (MDB)

(Foto: TRE/SE)

A candidata não cita nada sobre propostas para a população em situação de rua, nem mesmo utiliza o termo. Ao que parece, inclui o grupo populacional entre as pessoas de “extrema pobreza” e nos “mais vulneráveis”. Faltou clareza sobre se o governo dela irá tratar dessas pessoas que vivem nas ruas como um problema social de urgência ou se caminhará à sombra de outras ações. No plano, a candidata promete ampliar e garantir “a participação e o acesso da população aos seus direitos fundamentais”; a “renda mínima para a população em situação de pobreza extrema”; “o direito à moradia digna e de qualidade”; a ampliação da “rede de proteção e promoção de grupos vulneráveis”; o combate à miséria e à fome; e fortalecer e ampliar o “respeito à todas as formas de vida”.

EMÍLIA CORRÊA (PL)

(Foto: TRE/SE)

Otimizar o trabalho do “Consultório na Rua para pessoas em situação de vulnerabilidade social” é uma das propostas apresentada pela candidata no plano de governo. Esta política é voltada diretamente à população em situação de rua, mesmo não trazendo o termo em nenhuma das páginas. Também faltou detalhes de como essas ações serão aplicadas. Algumas propostas não estão nítidas se são para pessoas em situação de rua como: a implantação do “Centro de Segurança Alimentar: local próprio da gestão de alimentação para os restaurantes populares e casas de acolhimento”; a Cozinha Comunitária e Restaurante Popular, estes a serem administrados pelo município e entidades do terceiro setor”; os “projetos de Urbanização e Habitação para pessoas em situação de vulnerabilidade social”; apoio às Cooperativas de Catadores de Reciclados; e o “atendimento da criança e do adolescente em situação de abandono social, por meio do Programa de Convivência Familiar e Comunitária”.

LUIZ ROBERTO (PDT)

(Foto: TRE/SE)

No plano de governo, o candidato cita avanços da atual gestão, comandada pelo seu correligionário Edvaldo Nogueira, e se compromete em acabar com todas as formas de pobreza e a fome buscando a segurança alimentar e melhoria da nutrição através da agricultura sustentável. Afirma que vai criar a “Central de Encaminhamento Social para apoio às pessoas mais vulneráveis em temas como documentação, acesso aos benefícios”; ampliar o atendimento do horário de funcionamento do Centro POP e implantar o Projeto de Cozinha Solidária e Cozinha Comunitária no Centro POP, ofertando refeições, cursos/oficinas de capacitação culinária. Também afirma que dará “continuidade ao projeto FLORIR voltado à pobreza menstrual, com acesso a absorventes, inclusão na cesta básica ou distribuição nos postos de saúde” incluindo as “moradoras de rua”. Ainda promete o “programa Voluntário Animal” para apoiar voluntários com o fornecimento de ração para animais em situação de rua.

NIULLY CAMPOS (PSOL)

(Foto: TRE/SE)

O plano de governo da candidata tem dois pontos que fazem referência a este grupo populacional no município de Aracaju: a proposta de número 24 trata das “Políticas de abrigamento e moradia para a população em situação de rua” e da “Participação direta da população na definição da política social para ampliar os serviços de convivência e fortalecimento de vínculo familiar articulando com a política de educação, saúde e trabalho”, mas não apresenta detalhes de como serão executadas. Da mesma forma na proposta número 38 que aborda a “Política específica para os trabalhadores informais e a população de rua – sobretudo os menores e idosos – a partir da formação de um corpo técnico especializado que trabalhará em sintonia com os Conselhos Populares”.

YANDRA (União)

(Foto: TRE/SE)

O documento entregue pela candidata informa que implantará o Programa de Atendimento de Grupos Vulneráveis e fortalecerá a rede SUAS composta pelo CREAS, CRAS, Centro Pop, Centro-Dia e Unidades de Acolhimento. Afirma ainda que promoverá ações de apoio e acesso ao mercado de trabalho e negócios das pessoas em situação de rua. Porém, não detalha as ações e a execução delas. O programa de governo é desenvolvido com base nos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), como forma de buscar a inclusão dos grupos vulneráveis, das minorias, para garantir a “igualdade de oportunidade”.

ZÉ PAULO (Novo)

(Foto: TRE/SE)

O candidato Leão apresenta o plano de governo pautado na “necessidade de promover maior justiça social”, “ampliando o acesso à moradia e saneamento básico, aprimorando as ações e programas de segurança da sociedade”. Se compromete em “inserir as famílias na recuperação de pessoas de rua” e criar “restaurantes populares que garantam as três refeições diárias, em espaços que também permitam o banho, a lavagem de roupas e atendimentos médicos básicos, em pontos diversos da cidade, preferencialmente em colaboração com a sociedade civil”. Demonstra interesse no incentivo a geração de trabalho para a população em situação de rua e junto com outros órgãos buscará “promover a desocupação dos prédios com estrutura comprometida e redirecionamento das famílias ali encontradas, seja para o programa de Aluguel Social, seja para às unidades habitacionais construídas e voltadas à população de baixa renda”. O plano também carece de explicações de como as propostas serão executadas, fontes de orçamento e estudos que reforcem a dinâmica e necessidade do grupo foco das propostas. Ele também defende a ideia de reabilitação das pessoas em situação de rua para o retorno ao seio familiar e a “internação involuntária ou forçada” para os casos dos usuários de drogas, o que atinge diretamente às pessoas em situação de rua e contraria as leis brasileiras, inclusive decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que proíbe as práticas.

TRANSPARÊNCIA: A cobertura das eleições 2024 na Mangue está sendo realizada pelo consórcio formado pela Mangue Jornalismo, Ladata (Liga acadêmica de ciência de dados da UFS) e o Observa! (Observatório de Fake News do Centro de Excelência Atheneu Sergipense).

Isso aqui é importante!

Fazer jornalismo independente, ousado e de qualidade é muito caro. A Mangue Jornalismo só sobrevive do apoio das nossas leitoras e leitores. Por isso, não temos vergonha em lhe pedir algum apoio. É simples e rápido! Nosso pix: manguejornalismo@gmail.com

Deixe seu comentário:

CATADO DA MANGUE

Receba de graça as reportagens

Pular para o conteúdo