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Você conhece a história de Anísio Dário? Esse operário negro foi morto pela Polícia de Sergipe em 1947 e até hoje o Estado não foi responsabilizado

CRISTIAN GÓES, da Mangue Jornalismo

O nome de Anísio Dário é o primeiro a constar como vítima oficial de um Estado repressor no amplo Relatório Final de trabalhos da Comissão da Verdade “Paulo Barbosa de Araújo” do Estado de Sergipe (CEV/SE), um documento publicado no ano de 2020.

O sergipano Anísio Dário era um operário (carpinteiro) negro e comunista que foi barbaramente assassinado a espadadas e tiro no Centro de Aracaju no dia 29 de novembro de 1947 pelas forças policiais do Governo de Sergipe.

Passados quase 76 anos desse crime, e três em que ele figura no relatório final da CEV/SE, o Estado de Sergipe não foi responsabilizado, não assumiu sua culpa e não pediu perdão à família do operário. O mais grave é que o inquérito para apurar as responsabilidades do assassinato dele não foi concluído e, pior, sumiu.

A família de Anísio foi ameaçada e perseguida, fugindo de Sergipe para o Rio de Janeiro. Ele também nunca foi reconhecido como um anistiado político post mortem, sua família não recebeu qualquer indenização do Estado e sequer teve acesso ao atestado de óbito do operário.

Somente em março de 2008 o então governador Marcelo Déda homenageou Anísio Dário, dando seu nome a um Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (CERET). Logo depois, concedeu a ele a medalha de Ordem do Mérito Serigy post mortem. O prefeito de Aracaju, Edvaldo Nogueira, também fez homenagem a Anísio.

Em 2013, Zacarias de Andrade, um dos filhos de Anísio, esteve em 2013 em Aracaju para ter acesso à certidão de óbito do pai e percebeu que não havia registros de sua morte. Apenas nos últimos anos, o pesquisador Gilberto Francisco Santos (Gilfrancisco), conseguiu a certidão de óbito de Anísio e a entregou a sua família.

“Os culpados pela morte do trabalhador Anísio Dário de Andrade nunca foram responsabilizados legalmente: para os documentos e para a História de Sergipe, Anísio Dário sequer havia ‘existido’.”, revela o relatório final da CEV/SE, organizado por Andréa Depieri de Albuquerque Reginato e Gilson Sérgio Matos Reis.

Além do assassinato físico, Anísio também foi morto pelo esquecimento da história oficial de Sergipe. Pouca gente sabe de sua existência. Gilfrancisco conseguiu publicar no ano passado um livro sobre ele, “Anísio Dário – a chacina da Rua João Pessoa”.

Anísio: único retrato da vítima do Estado de Sergipe (Foto Arquivo)

Alguns antecedentes ao assassinato de Anísio Dário

Grande parte do texto que você lerá daqui em diante está no relatório final da CEV/SE, que demarcou o ano de 1946 como o ponto de partida para início das pesquisas das violências do Estado em Sergipe, ano da promulgação da nova Constituição, marco de superação da ditadura do Estado Novo instalada pelo presidente Getúlio Vargas.

Com a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial, em 1943, o Partido Comunista Brasileiro (PCB) optou em apoiar a política de guerra do Governo Vargas contra os regimes nazifascistas da Europa. Convocavam, ao mesmo tempo, o povo brasileiro para lutar por uma Assembleia Nacional Constituinte e pela retomada da democracia.

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945 e diante da força da campanha pela Constituinte conduzida pelas organizações populares e pelo PCB, Vargas viu-se obrigado a constituir uma frente pró-redemocratização, abrandando o regime ditatorial no país. Como consequência, presos e perseguidos políticos de 1935 foram anistiados e teve início a transição para a democracia e uma nova Constituição.

A Anistia de 1945, a Constituição de 1946 e a posição do Partido Comunista durante a Segunda Guerra o fortaleceu enquanto organização política e contribuiu para o seu reconhecimento popular de modo que, mesmo em 1945, o Partido Comunista já somava cerca de 100 mil sindicalizados no Brasil. A popularidade do PCB se refletiu nas eleições de 02 de dezembro de 1946, no qual obteve cerca de 10% da votação.

Entretanto, em 1947, durante o governo do novo presidente da República, Eurico Gaspar Dutra (PSD) (1946–1951), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) acolheu as denúncias oferecidas pelo deputado Barreto Pinto (PTB/RJ) e, por três votos a dois, em 07 de maio de 1947, o PCB foi novamente considerado ilegal, desta vez por decisão da Justiça Eleitoral.

As consequências da ilegalidade do PCB puderam ser vistas por todo o país: mais uma vez, comunistas e simpatizantes foram reprimidos, presos e mortos; órgãos da imprensa passaram a funcionar sob censura. As autoridades locais não perderam tempo para seguir, à risca, as ordens do Ministério.

É nesse contexto em que, no Estado de Sergipe e durante o Governo José Rollemberg Leite (1947-1951), foi morto o operário e sindicalista Anísio Dário, durante manifestação que contestava a cassação do Partido Comunista.

Governador Rollemberg Leite (1947-1951) (Foto Arquivo)

A morte de Anísio Dário

Anísio Dário era operário da construção civil, sindicalista, morador de Aracaju, e foi morto pela ação repressiva articulada pela Secretaria de Segurança Pública do Estado de Sergipe (SSP/SE), em 29 de novembro de 1947.

Naquela data acontecia entre a Rua João Pessoa e a Praça Fausto Cardoso uma manifestação contra o Poder Judiciário, que dissolvera arbitrariamente o PCB, e contra o autoritarismo do Governo Dutra que cassara os mandatos dos parlamentares do PCB nas esferas estadual e federal.

Em Sergipe, dentre os representantes do PCB cassados, estavam o deputado estadual Armando Domingues e os vereadores Agonalto Pacheco, Carlos Garcia e Otávio José dos Santos, além do sergipano Osvaldo Pacheco da Silva, deputado federal eleito por São Paulo.

De acordo com o jornal O Nordeste, para frear a manifestação e “manter a ordem”, quatro tropas foram mobilizadas pelo secretário do Interior e da Justiça, João de Araújo Monteiro: o Corpo de Bombeiros, comandado pelo capitão João Lins; uma tropa de Infantaria Militar, chefiada pelo capitão Amintas; a Cavalaria, sob as ordens do capitão Temístocles e a Polícia Civil, liderada pelo coronel Djenal Tavares Queiroz.

O objetivo das tropas era tomar os principais pontos do Centro de Aracaju. Em frente ao Cinema Rio Branco, encontravam-se, cercados de grande número de manifestantes, o deputado Armando Domingues, os vereadores Carlos Garcia e Otávio José dos Santos que, de última hora, foram notificados sobre a proibição do comício pelo secretário João de Araújo Monteiro.

Com isso, tendo conhecimento da quantidade de tropas presentes, o deputado Domingues teria tentado convencer os manifestantes a dispersar, não conseguindo fazê-lo antes da ação da polícia.

Ainda de acordo com o jornal O Nordeste, a repressão teve início com a ordem expedida pelo coronel Djenal Queiroz, sob o comando do governador José Rollemberg Leite (PSD). Autorizadas, a Cavalaria e a Polícia Militar iniciaram a repressão ao comício, “dando de espadas nos homens e mulheres, patas de cavalo, [e] espancamento em plena via pública”.

Nesse cenário de atuação truculenta das forças policiais, foi disparado o tiro que dissipou a vida do operário Anísio Dário, que deixou esposa e doze filhos. Ele foi encontrado pelo vereador Armando Garcia Filho (PSB), mas não conseguiu viver o suficiente para receber atendimento hospitalar.

Em relato ao jornal O Nordeste, Garcia Filho contou que visualizou “uma faísca, na altura média de um metro, partida do local onde passa o bonde próximo à Casa Mascarenhas” e que o local de onde se ouviu o tiro estava sem iluminação. Porém, a penumbra deixada pela luz do Cinema Rio Branco permitiu que o vereador “visse ali grupos de soldados da Cavalaria e de elementos da Polícia Militar”.

Garcia Filho, que era médico, descreveu que encontrou Anísio Dário com “ferimento cortante de espada ou facão, na região supraciliar e outro perfurante, de projétil, na região da aorta”. Apesar de ser a principal testemunha dos fatos, o depoimento do vereador não foi registrado oficialmente.

“A morte do operário explicita um novo ciclo de repressão voltada para o combate ao comunismo. A partir da Instrução federal as ações locais passaram a ser coordenadas pelo Governo do Estado e sua Secretaria de Segurança Pública, e concretizadas pela Polícia Militar do Estado de Sergipe”, denuncia o relatório final da CEV/SE.

Djenal Queiroz: chefe da polícia em 1947 (Foto Arquivo)

Um crime nunca “apurado”, romaria e perseguição à família

O inquérito para apuração da autoria e da materialidade do crime nunca chegou a ser instaurado, apesar das solicitações realizadas pela família do operário assassinado. Oportunamente, o Governo de José Rollemberg Leite silenciou a respeito dos fatos ocorridos na manifestação de 29 de novembro de 1947, cuidando, tão somente, de divulgar uma nota oficial expedida pelo Departamento de Segurança Pública, no dia 1º de dezembro daquele ano.

A nota responsabilizava os comunistas pelo acontecimento, uma vez que, de acordo com o departamento, “não foi dado um tiro sequer por parte da polícia que procedeu de maneira elogiosa, sem usar a violência ou excesso para manutenção da ordem”.

Diante da injustiça e gravidade das declarações do Governo de Sergipe, foi organizada uma romaria em homenagem a Anísio Dário, que ocorreu na sede do Sindicato dos Operários da Construção Civil duas semanas após o sepultamento do operário.

Na ocasião, sob as ordens do secretário João de Araújo Monteiro e execução do chefe da Polícia Civil-Militar Djenal Queiroz, tentou-se impedir a visita ao túmulo do sindicalista, possivelmente para evitar maior repercussão sobre as circunstâncias da morte de Anísio Dário.

Apesar disso, a romaria organizada pelo sindicato aconteceu com a presença de figuras políticas, amigos, militantes e trabalhadores que, em um último momento, se despediram de Anísio Dário e reivindicaram a responsabilização das autoridades competentes.

Em entrevista, Eurídice Lima Bispo, uma das filhas de Anísio Dário, relatou que após a morte do operário, a família sofreu perseguições constantes, de modo que se viram obrigados a deixar Sergipe. A partir de 1950, a esposa e os 11 filhos de Anísio Dário passaram a residir no Rio de Janeiro.

Segundo Eurídice Lima e como demonstram os processos datados de 1952 do Tribunal de Justiça de Sergipe (TJ/SE) – cujo objetivo era apurar ações de comunistas no estado – o sustento da família do operário procedia da contribuição do PCB de Sergipe, que destinava parte do dinheiro arrecadado com a venda de jornais, bem como da contribuição dos trabalhadores, em especial os ferroviários.

Vale lembrar que o assassinato de Anísio Dário, a perseguição à sua família e constante repressão aos demais membros ou não do PCB em Sergipe ocorriam num Brasil com nova constituição e que se dizia democrática.


Direito à verdade, à memória, à reparação e à reforma institucional

Por designação do Governo do Estado de Sergipe, a Comissão Estadual da Verdade de Sergipe (CEV/SE) foi constituída desde a posse, em 7 de julho de 2015, até a apresentação do relatório final em 2019 (publicado somente em 2020), por Josué Modesto dos Passos Subrinho, Andréa Depieri de Albuquerque Reginato, Gilson Sérgio Matos Reis, Gabriela Maia Rebouças e Gilberto Francisco Santos.

Os trabalhos da CEV/SE foram desenvolvidos por servidores, estagiários, pesquisadores e também por voluntários cuja contribuição foi valiosa. Muito da mobilização da Comissão buscou o direito à verdade, à memória, à reparação e à reforma institucional.

O direito à Memória e à Verdade corresponde ao reconhecimento dado às vítimas e a toda a sociedade de que o Estado e setores institucionais e/ou civis foram responsáveis por violações de direitos humanos.

O direito à Justiça pode ser compreendido de duas maneiras. A primeira delas diz respeito ao direito individual das vítimas de verem seus algozes punidos pelos crimes que cometeram contra elas mesmas ou contra seus familiares e entes queridos. A outra maneira diz respeito ao direito coletivo de que criminosos não permaneçam impunes em relação aos seus crimes.

Para além do direito ao reconhecimento de sua história, memória e verdade, as vítimas de graves violações de direitos humanos devem ser reparadas material, simbólica e psicologicamente. Com relação à reparação material, normalmente se apela à ajuda financeira ou a indenizações compensatórias pagas pelo Estado em reconhecimento da violência infringida por seus agentes às vítimas.

O direito à Reforma Institucional é um direito das vítimas e de toda a sociedade. Ele se dá quando o Estado reconhece que o legado de um período autoritário e violento necessita ser interrompido e que, ao término de um período de conflitos e violências, as instituições responsáveis por essas devem ser extintas ou reformadas, os agentes punidos e as leis autoritárias devem ser removidas.

Capa do livro de Gilfrancisco (Foto Divulgação)

A Mangue Jornalismo vai contribuir com o direito à verdade e à memória

É obrigação do jornalismo contribuir para a efetivação do direito à verdade e à memória. A Mangue Jornalismo vai buscar, dentro de suas limitações, publicar periodicamente grande parte do Relatório Final de trabalhos CEV/SE.

Das 27 recomendações elencadas pela CEV/SE em seu relatório final, a de número 01 é: “Ao Governo do Estado de Sergipe que realize pedido de desculpa pública, reconhecendo a responsabilidade institucional das forças policiais estaduais pela prática de graves violações de Direitos Humanos (prisões ilegais, torturas, execuções, entre outras) perpetradas durante o período de 1946 a 1988”.

A CEV/SE emitiu uma recomendação específica sobre a morte de Anísio Dário. Recomendação número 09: “Que o Governo do Estado de Sergipe dê continuidade às investigações sobre o assassinato do operário sindicalista e membro do Partido Comunista Brasileiro, Anísio Dário, ocorrido na noite de 29 de novembro de 1947, em plena via pública do centro de Aracaju”.

Vale lembrar que em Aracaju e em Sergipe existem vários prédios públicos, áreas internas, ruas, avenidas, conjuntos habitacionais com nomes de José Rollemberg Leite, Djenal Tavares Queiroz e outros.

Mais detalhes sobre a vida e morte do operário negro e comunista Anísio Dário podem ser lidos na obra “Anísio Dário – a chacina da Rua João Pessoa” (2022), de Gilfrancisco (contato: gilfrancisco.santos@gmail.com).


Jornal do Povo. Aracaju, 31 de dezembro, 1947

Vejamos o artigo do jovem jornalista João Batista de Lima e Silva publicado no Jornal do Povo, de Aracaju na edição de 31 de dezembro, 1947, sobre o assassinato do operário Anísio Dário pela força policial do Estado de Sergipe:

O Sangue do Povo

Aconteceu a 29 do mês passado: – mataram em Aracaju um operário preto. Era carpinteiro, chefe de família numerosa – tinha 12 filhos e chamava-se Anísio Dário.

Anísio, ao lado de centenas de trabalhadores, funcionários, estudantes e intelectuais sergipanos acorria ao apelo dos democratas daquele estado, que pretendiam realizar uma demonstração pública, de protesto contra a cassação dos mandatos do povo. O comício não foi, entretanto, realizado, porque os seus promotores, diante das provocações policiais, estúpidas e agressivas, resolveram adiá-lo a fim de impedir o banho de sangue que o vereador Rolemberg Leite e seu secretário geral – conhecido como João Primeiro de Abril de Araújo Monteiro – haviam planejado contra o povo.

As ordens transmitidas pelo Chefe do Executivo sergipano ao seu chefe de polícia era a de impedir – a qualquer preço – que os democratas, usando dos direitos assegurados na Constituição, expressassem o seu repúdio e protesto contra as constantes violações que vem sofrendo a Carta de 46. A Ordem era de prender, espancar, espingardear o povo: de fazer correr o sangue dos democratas da terra de Fausto Cardoso.

A decisão dos promotores do comício, não impediu, porém, que o Chefe de Polícia de seus capangas cumprisse, à risca, a ordem recebida – Fizeram – como se diz em seu linguajar – um trabalho bem feito. Tinha carta branca para agir contra o povo – e, por isso, espaldeirou trabalhadores, e agrediu inclusive parlamentares. E para dar o exemplo não deixaram passar a oportunidade de assassinar friamente, pelo menos um democrata, já que não era possível um massacre em regra. Possivelmente, para os comandados do chefe de polícia sergipana – cujo pai, conhecido integralista, preso como quinta-coluna durante a guerra, ameaçava de revólver em punho os cidadãos presentes – mais interessante seria liquidar sob suas balas assassinas o deputado e os vereadores comunistas, presentes à concentração. Isso, porém, seria ir muito longe em vista de não se haver realizado o comício. Para dar exemplo escolheram por isso, um operário. Um operário preto. Que é, a final, um operário preto para um capanga da oligarquia de senhores de terra, que domina, hoje, o Estado de Sergipe. A morte desse operário preto teria – segundo os cálculos dos bandidos que o assassinaram – o mesmo significado dos suplícios exemplares que os avós do atual governador costumava aplicar contra algum dos seus escravos, para que os demais aprendessem a lição.

O crime foi rápido. Enquanto o deputado Armando Domingues se dirigia à multidão pedindo para dispersar e protestando contra a violação do direito constitucional de reunião pacífica, um grupo de cavalerianos e tiras cercou Anísio Dário e levou-o para um canto longe do local onde se aglomeravam os que vieram à praça defender os mandatos populares. Aí desfecharam-lhe um golpe de espada na testa e alvejaram-lhe, depois uma bala no coração.

Morreu Anísio Dário – informam os jornais de Aracaju – dando vivas a democracia e à Constituição.

Era um operário humilde, estimado de seus camaradas e dos trabalhadores aracajuanos. Vivo Anísio Dário era apenas um homem, como milhares de outros companheiros seu neste país: – honesto pai de família, trabalhador escrúpulos, firme militante comunista, consciente dos interesses de sua classe. Hoje, seu nome é símbolo.

Símbolo da resistência ativa das massas populares ao terrorismo que se quer reimplantar entre nós, símbolo da firmeza com que nosso povo, tendo à frente a classe operária e a sua vanguarda política, à qual ele pertencia desde 1935 – e com que justo orgulho! – Enfrenta as investidas do imperialismo ianque e de seus “paus mandados” nacionais, contra as liberdades democráticas, o progresso e libertação de nossa terra.

A grande massa popular que compareceu ao enterramento de Anísio Dário, os discursos que operários intelectuais, de populares e vereadores pronunciaram junto ao seu túmulo e mais ainda, as palavras da filha mais velha: – “Prometo, meu pai, que serei mais comunista do que antes e que sua morte será vingada, pois haveremos de derrotar a reação” – tudo isso já é a transfiguração do nome do humilde operário sergipano para o sentido simbólico que lhe deu o frio e perverso assassino de que foi vítima. Seu nome hoje significa a determinação, a coragem, o patriotismo militante das forças populares brasileiras, que farão recuar a ditadura, em seus propósitos criminosos de tornar o nosso país um campo de concentração e o nosso povo um rebanho de servos, à disposição do cupidez e das aventuras guerreiras do imperialismo ianque.

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Não é justo, porém que se veja no assassinato de Anísio Dário somente um símbolo e um exemplo de sacrifício honroso na luta de resistência democrática. Neste crime há, do outro lado, o banditismo que a ditadura está oficializando no país, e contra o qual é preciso protestar com violência e firmeza. Há o inominável atentado contra a vida de um cidadão patriota, que, usando de um legítimo direito constitucional, dirigia-se à praça pública para defender a Constituição Contra este atentado é preciso protestar com energia.

É preciso fazer sentir ao interventor de Dutra, em Sergipe, que suas mãos estão tintas de sangue: que seus auxiliares, mais imediatamente responsáveis pelo crime, – o secretário Araújo Monteiro e o chefe de polícia Djenal Tavares – precisam ser afastados de seus cargos e punidos pelo assassinato que planejaram.

É necessário que todos os democratas, de todos os Estados, demonstrem praticamente sua solidariedade à luta de defesa da Constituição e das liberdades democráticas, por que morreu lutando o trabalhador Anísio Dário. E que demonstrem essa solidariedade, também, amparando materialmente a família daquele combatente da Democracia.

Deste modo, levaremos ao conhecimento dos agentes da Ditadura terrorista que está ensanguentando a nossa terra, que as forças democráticas brasileiras estão ao lado de Anísio, dos objetivos que o levaram à praça pública onde encontrou os seus assassinos e têm da maioria os nomes criminosos que, cedo ou mais tarde, responderão pelo crime monstruoso.

Anísio Dário – a chacina da Rua João Pessoa. Gilfrancisco. Edições GFS, Aracaju, Coleção Base 11, 2022.

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