A Mangue Jornalismo vai tentar entrevistar todas(os) as(os) candidatas(os) à Prefeitura de Aracaju. Para garantir a isenção, as perguntas apresentadas são rigorosamente iguais para todos(as) elas(es). As respostas também devem ter o mesmo tamanho (até 15 linhas em espaço simples, fonte Arial e tamanho 11).
A primeira entrevista da série sobre Eleições 2024 é com a candidata Niully Campos, do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Ela é candidata da Federação PSOL/Rede Sustentabilidade. O candidato a vice-prefeito é o professor Alexis Pedrão (PSOL).
Niully Nayara Santana Campos tem 36 anos, nasceu em Capela, Sergipe, é advogada e professora. Também é mestra em Direito pela Universidade Federal de Sergipe (UFS). Junto ao Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe (TRE/SE), Niully Campos não declarou bens.
O Plano de Governo para Aracaju apresentado pela candidatura de Niully Campos está dividido em quatro eixos orientadores: 1) Aracaju democrática; 2) Aracaju justa: Políticas públicas de combate às desigualdades sociais, 3) Aracaju sustentável e 4) Aracaju diversa: Direitos humanos e combate às opressões.
O plano apresenta também 50 propostas, que se dividem em emprego e renda; desenvolvimento urbano: plano diretor, meio ambiente, moradia e mobilidade; cultura, história e memória; assistência social; criança, adolescente e juventude; por uma cidade das mulheres; segurança pública; saúde; educação; democratização do orçamento, do poder Executivo e Legislativo. Acesse o plano com a proposta da candidata no site do TRE/SE.
Segue a entrevista com a candidata:
Mangue Jornalismo (MJ) – Qual a avaliação geral da gestão da Prefeitura de Aracaju que se encerra em dezembro?
Niully Campos (NC) – A gestão de Edvaldo traz uma avaliação péssima. A gente sabe que Aracaju também não é a mesma de alguns anos atrás. Houve mudança, um crescimento da cidade e maior vinda de recursos públicos. Há uma melhoria na cidade, mas essa melhoria não encontra a maioria da população. A gestão de Edvaldo privatizou a cidade. Infelizmente, não se entrega serviço público de qualidade, é uma gestão que não dialoga com o servidor público. É uma cidade que entrega qualidade de vida só na propaganda da televisão, porque a gente tem transporte público sucateado, uma passagem muito cara, desigualdade na cidade, temos uma cidade que anda na contramão do mundo no que se refere a desenvolvimento e a sustentabilidade. Então, é uma gestão que passou muitos anos governando e que não justifica a ausência de políticas reais que impactem diretamente a melhoria da vida do povo. Acho que o grande problema é que a gente tem o orçamento da prefeitura direcionado para poucos grupos que dominam a cidade: a especulação imobiliária, para os contratos de lixo, os contratos das organizações sociais na saúde, para os contratos de transporte coletivo que estão aí há anos e temos uma licitação agora por provocação do próprio Ministério Público. É possível fazer muito mais e muito melhor.
MJ – Nos últimos anos, a gestão municipal de Aracaju foi muito agressiva contra o meio ambiente, destruiu árvores, aterrou manguezais e permitiu o avanço de construtoras sobre a antiga Zona de Expansão, local de adensamento restrito e de áreas de proteção ambiental. Além disso, Aracaju é uma das poucas capitais que não têm um plano de enfrentamento à crise climática. Aracaju só tem 4% das áreas ambientais protegidas. Quais suas propostas para o meio ambiente na cidade?
NC – Para nós, do PSOL, construir uma cidade sustentável não é um slogan de eleição. A gente já trabalha a sustentabilidade desde muito tempo, quando as pessoas achavam que essa era uma pauta do futuro, para nós já era uma pauta do presente, porque a gente não entende sustentabilidade como forma de slogan de eleição, porque nós não estamos em guerra com o ambiente. Precisamos entender que nós somos parte dele e isso implica necessariamente em uma mudança de paradigma muito grande na gestão em Aracaju. É você pensar a cidade toda numa perspectiva ecossocialista, então desde a ideia de você garantir uma cidade que até a mobilidade seja pensada numa perspectiva de redução de emissão de poluentes, criar um programa grande de rearborização da cidade, já que estamos na contramão do mundo, derrubando tudo e passando asfalto, construir de fato uma cidade esponja. Muitas candidaturas que estão postas têm algum vínculo, alguma ligação com essa especulação imobiliária ou com aqueles que dominam o capital na cidade, mas temos a tranquilidade e legitimidade para dizer que nós temos independência e compromisso na pauta da sustentabilidade como uma pauta de vida para o pessoal.
MJ – Aracaju tem uma frota de ônibus pequena e caindo aos pedaços. Foi realizada uma polêmica licitação e tudo vai continuar como antes, mas com aumento da tarifa. Quais suas propostas para o transporte urbano e a mobilidade em geral?
NC – Quando chegarmos à Prefeitura de Aracaju, vamos implementar o busão 0800. É possível implementar a tarifa zero em Aracaju, e para nós é um compromisso de garantir tarifa zero como condição de direito à cidade para todo mundo, [algo] que está no nosso eixo programático do PSOL. É muito difícil imaginar que hoje as pessoas gastam uma parte significativa do seu orçamento ou para pagar aluguel ou para pagar transporte, então você tem uma licitação que saiu à toque de caixa, depois de uma provocação do Ministério Público, porque o prefeito passou mais de 20 anos sem apresentar essa licitação e aí vem sem grandes exigências para as empresas de transporte e já apontando um aumento de passagem para R$ 5,00. Vamos garantir o busão 0800 numa perspectiva de ampliação desse direito, a gente pode começar, inclusive, com parcerias com as próprias empresas e depois a gente quer avançar para garantir tarifa zero com a empresa municipal de transporte, financiando subsidiando o grosso dessa implementação. Além disso, a gente pode pensar em parcerias como o Busdoor, como revitalização dos terminais e quem vai se utilizar para fazer propaganda dos terminais pode subsidiar uma parte disso. Temos a ideia de diversificar as fontes de financiamento.
MJ – A capital de Sergipe tem um dos piores índices em transparência pública, segundo pesquisa nacional da Universidade de São Paulo. Quais seus compromissos com a transparência dos atos públicos?
NC – Eu acho isso fundamental porque não dá para a gente garantir uma gestão democrática, que é o nosso primeiro eixo, se a gente não pensar em transparência, participação popular real e depois controle social dessa política pública. Porque às vezes não adianta você ter uma transparência de mentira. Aracaju tem índices péssimos de transparência, mas não é só colocar lá a informação de qualquer jeito, a informação precisa ser clara e precisa ser uma informação acessível para a população. As pessoas precisam entender aqueles números que são colocados lá, porque isso é garantir transparência de verdade para que a população se anime para a participação real. Queremos resgatar o orçamento participativo, usando tecnologia para que o cidadão diretamente participe das decisões da cidade, mas também fortalecendo os conselhos municipais. Queremos fortalecer esse sistema permanente de diálogo com a população que não seja um faz de conta, que seja de fato uma instância deliberativa consultiva e que possa também influenciar diretamente na decisão da prefeita, ouvindo também a expertise dos profissionais que trabalham, que estão no funcionalismo público em Aracaju, garantir mesa de negociação permanente com os servidores públicos e ouvir a ciência.
MJ – Há uma reclamação generalizada dos artistas locais sobre a cultura. Falta de transparência, participação, cachês ridículos, favorecimentos políticos. A gestão da cultura no município parece ser um caso. Quais suas propostas para alterar esse quadro?
NC – Precisamos olhar a cultura com o respeito que ela merece. Eu digo isso porque tenho um artista em casa, meu companheiro é artista local e os desafios são cotidianos. Eu acho que está na hora de entender que Aracaju é uma cidade absolutamente diversa e com muita potência cultural, ao tempo em que o acesso a esses bens, a essas riquezas, ao patrimônio cultural, ainda alcança pouca gente. Precisamos garantir política pública permanente de incentivo aos artistas locais, para que, inclusive, eles possam difundir toda a produção cultural para outros municípios, outros estados e para todo o Brasil. É garantir que a gente consiga executar os recursos nacionais. Precisamos garantir paridade, respeito à formalização do Conselho Municipal de Cultura. Precisamos avançar numa perspectiva de aprovação do Plano Municipal de Cultura. A gente conseguiu isso agora muito recentemente, mas é preciso pensar na regulamentação do Fundo Municipal de Cultura, porque política pública precisa de orçamento. A cultura é direito fundamental e isso significa também levar para o centro da cidade festivais permanentes, ampliar o número de galerias na cidade para democratizar o acesso desses artistas a esses espaços de exposição.
MJ – Antes conhecida como “capital de qualidade de vida”, Aracaju avança numa situação de dezenas de pessoas em condição de rua. Homens, mulheres, crianças e idosos abandonados pelo poder público municipal. Como será enfrentada a questão em seu governo?
NC – Um dos eixos do nosso programa é Aracaju justa e Aracaju diversa. É a Aracaju que respeita as subjetividades, das diversidades de sua população e notadamente da população mais vulnerabilizada, inclusive a de rua, que precisa ser enxergada e parar de ser invisibilizada. O primeiro passo é termos uma contagem da população em situação de rua, porque eu não posso produzir política pública se eu não tenho nem a contagem dessa população, que é uma das primeiras diretrizes, um dos primeiros objetivos da política nacional da população em situação de rua. E é você pensar nessa população em sua heterogeneidade, é buscar quais são os desafios e a escuta ativa e real dessas populações, para que possamos integrar com as políticas de assistência. Primeiro, isso precisa ser garantido. É pensar na ocupação dos espaços públicos vazios, abandonados em Aracaju, que precisam servir de moradia digna para as pessoas. Vamos pensar também em desapropriar determinados espaços privados que não estão cumprindo sua função social. A gente precisa de locais de acolhimento em mais de um ponto da cidade, além de pensar na saúde mental dessas pessoas.
MJ – Na cidade também existe uma reclamação generalizada das pessoas que precisam do serviço de saúde: faltam remédios básicos, não se consegue fazer exames simples e muito menos há atendimento de especialistas. Quais suas propostas para saúde em Aracaju?
NC – Primeiro, precisamos desprivatizar a saúde de Aracaju. Não dá para gastar o orçamento da saúde de Aracaju sempre com intermediários. Sem garantia mínima, inclusive de respeito para os profissionais que estão desempenhando ali aquela atenção básica. Precisamos de um olhar para a saúde integral. Isso passa pelo saneamento básico e valorização da Deso, pois não podemos privatizar nossa água. Precisamos universalizar serviços de esgotamento sanitário e pensar em uma alimentação adequada para a população. Após pensar na parte preventiva, é importante ampliar a atenção básica à saúde. A primeira coisa é fazermos concurso em todas as áreas da saúde, zerar as filas de exames e fazer com que a política de saúde da família seja ampliada em parceria com o governo federal. Precisamos ampliar e garantir a presença de profissionais da psicologia nas unidades básicas de saúde, porque a saúde mental é uma situação urgente e precisa de uma ação imediata. Precisamos pensar também na saúde da mulher, com a oferta de uma política pública de saúde com atendimento pré-natal, perinatal e pós-natal de qualidade, com acompanhamento do seu obstetra para que ele seja o obstetra que vai fazer o seu parto. Somos uma chapa que tem independência para implementar essas mudanças.
MJ – Na educação a cidade também não vai nada bem. São mais de 2,8 mil crianças da educação infantil fora da escola porque não há vagas. Além disso, os professores até hoje pedem que seja cumprida a lei do piso salarial. Como pretende enfrentar os graves problemas da educação no município?
NC – Em nosso programa de governo, a gestão da educação é uma pauta inegociável. O primeiro compromisso é pagar o piso de professor, porque não dá para a gente construir educação de qualidade se desrespeitarmos quem tá no chão da escola todo dia. Minha mãe é professora, eu sou professora, meu vice-prefeito é professor. Aracaju tem condição de reajustar o orçamento para pagar o piso profissional dos professores e das professoras, mais do que isso, valorizar profissionais de educação, como a merendeira e o porteiro, por exemplo. Precisamos também da realização de concurso público e não de Processos Seletivos Simplificados (PSS). Queremos construir uma escola aberta para a comunidade, com educação em tempo integral. Outro ponto são as creches, precisamos ampliar de imediato as vagas em creche com a construção de novos equipamentos, mas com outras parcerias que garantam zerar essa fila de imediato. Não dá para contarmos somente com a nossa rede de apoio. Não queremos também qualquer tipo de creche, mas que haja alimentação adequada, profissionais capacitados e um programa pedagógico para o desenvolvimento daquelas crianças por meio de um atendimento especializado.
MJ – O Centro de Aracaju está abandonado. O patrimônio público esquecido e destruído, inclusive a sede da própria prefeitura. Existem ruas desertas, quase fantasmas. Quais suas propostas para o Centro?
NC – Eu lamento muito que o Centro de Aracaju enfrente essa situação de abandono e às vésperas de eleição a gestão diga “Agora vamos construir um estudo para revitalizar o Centro”. Por que essa gestão não fez isso até agora? Essa turma está no poder há muitas décadas e a maioria das candidaturas que estão aí postas, de alguma forma, estão umbilicalmente ligadas com esses mesmos grupos que estão no poder. Um dos eixos do nosso programa pensa nessa Aracaju sustentável a partir da revitalização do Centro. Isso envolve a recuperação do nosso patrimônio histórico e cultural. Além disso, envolve também criar um programa de impacto por meio de economia criativa, que faça o Centro pujante, manhã, tarde e noite, para que as pessoas possam circular, possa ter restaurante, possa ter arte e cultura desenvolvida na rua. Queremos fortalecer pontos, não somente de turismo, mas pontos de desenvolvimento cultural por todo o Centro de Aracaju, além do que eu já disse, de revitalizar mesmo o Centro. Eu acho fundamental que a gente faça isso de forma imediata. Com isso, teremos o estímulo ao trabalho e renda no Centro, respeitando a forma de vida das pessoas, mas garantindo que aquele Centro com economia criativa, com bar, com restaurante, com programa cultural permanente, possa gerar essa movimentação.
MJ – Sendo eleita, quais os primeiros atos de sua gestão?
NC – A primeira coisa que a gente quer fazer é a auditoria das contas públicas, porque precisamos entender para onde está indo o nosso dinheiro. Vamos desprivatizar a prefeitura e a cidade. Nós vamos garantir que a cidade, a prefeita, não seja uma mera intermediária entre o orçamento público e a gestão de contratos milionários. Quando a gente fala que vai desprivatizar Aracaju, não significa que ninguém vai interferir contrariamente no seu comércio, não. Muito ao contrário. Porque, às vezes, a extrema direita vende essa ideia de que nós estamos contra a iniciativa privada. O que a gente não pode é ter uma cidade comandada por poucos. Vamos implementar o Busão 0800. A gente tem que garantir que o transporte público, que a licitação seja entregue, tendo o povo como prioridade e não o lucro das empresas. Queremos também um programa de ampliação de renda básica permanente para a população em situação de vulnerabilidade, de construção de moradias e de respeito e de busca de ocupação dessas moradias. Por quê? Porque, primeiro, a dignidade. E dignidade é você garantir que o povo de Aracaju tenha o que comer, tenha onde morar, tenha saúde pública de qualidade para poder trabalhar. Nosso lema é Coragem. Coragem, Aracaju. Para a gente mudar na eleição também.
TRANSPARÊNCIA 1:
Cada pergunta poderia ser respondida em até 15 linhas e as(os) candidatas(os) foram informadas(os) de que, se o tamanho da resposta ultrapassasse o limite determinado, haveria edição. Nesta entrevista, a repórter o ajuste necessário, mas manteve as ideias centrais da candidata em cada resposta.
TRANSPARÊNCIA 2:
A cobertura das eleições em 2024 está sendo realizada pelo consórcio formado pela Mangue Jornalismo, Ladata (Liga acadêmica de ciência de dados da UFS) e o Observa! (Observatório de Fake News do Centro de Excelência Atheneu Sergipense).