CRISTIAN GÓES, da Mangue Jornalismo
“Aracaju não tem Carnaval”, “Fujo do Carnaval de Salvador para descansar em Aracaju”, “Como Aracaju não tem Carnaval, vou a Olinda”. Quem nunca escutou essas afirmações? Frases tão poderosas, ditas e repetidas ao longo de muitos e muitos anos, que se constituíram como verdades na história da capital.
Entretanto, a história dita somente é construída a partir do muito que não foi dito. Vez ou outra, escapam luzes por brechas muito finas na parede do tempo, libertando o que estava invisível, fazendo que a história absoluta seja obrigada a ser repensada.
É isso que a banda Samba do Arnesto está fazendo: encontrou uma fresta e a convidou para revelar muita história não dita sobre o Carnaval de Aracaju. O resultado dessa incursão na memória é o filme-documentário “Sem corda, sem abadá e sem vergonha – Uma história de carnaval e resistência pelas ruas de Aracaju”, que será lançado no próximo dia 28, às 17h30 no Cine Vitória, no Centro de Aracaju.
“Durante muito tempo, predominou-se no senso comum aracajuano, a ideia de que aqui ‘não tem Carnaval’, que ‘Aracaju é uma cidade para descansar’, e por conta disso, o Carnaval de rua da cidade foi negligenciado e caído no esquecimento”, afirma Roque Sousa, um dos fundadores da banda e roteirista do documentário.
Os governos contribuíram para essa invisibilização
A realização do Pré-Caju, um pouco antes do Carnaval, com aporte financeiro e envolvimento direto das estruturas do Governo do Estado e da Prefeitura de Aracaju contribuiu para empurrar o Carnaval de rua da cidade para as camadas profundas do esquecimento. Isso contribuiu para sedimentar uma mentira: “O Carnaval de Aracaju é o Pré-caju”.
Essa lógica influenciou o turismo, o setor cultural, os investimentos públicos e a sociedade. Passa-se a engolir uma narrativa midiática falsa de que “Aracaju não tem Carnaval”, de que “a cidade fica vazia”, de que “a capital é do descanso e os hotéis faturam com isso”. Governo do Estado e Prefeitura de Aracaju praticamente não investiam na festa de rua da cidade.
“Foi pensando em disputar essa narrativa, que a banda se debruçou sobre a história do Carnaval de rua de Aracaju e resolveu produzir o documentário chegando à seguinte conclusão: Sim! Aracaju tem Carnaval!”, destacou Rafael Oliva, um dos fundadores da banda e produtor executivo do documentário.
Existem registros que desde o século XIX já existia um pujante Carnaval de Aracaju, com blocos organizados, a exemplo do Mercuriano e do Cordovínio. Entretanto, lembra o memorialista Murilo Melins, que foi nos anos de 1940 e 1950 que a Festa de Momo na capital vai ganhar mais corpo, tomando a praça Fausto Cardoso, popularmente conhecida como “Clube do Povo”.
“O Carnaval de Aracaju era precedido por batalhas de confetes na Praça Fausto Cardoso, rua João Pessoa, Atalaia e pelos bailes pré-carnavalescos pelos clubes da cidade. (…) A folia iniciava-se palidamente, a partir das 16h do sábado. O comércio havia fechado as suas portas ao meio-dia. Mas, à tarde, algumas casas abriam uma das portas para a venda de lança-perfumes, confetes e serpentinas”, escreve Melins em seu livro “Aracaju Romântica que vi e vivi.
Sem corda, sem abadá e sem vergonha e o Arnesto
O documentário da turma do Arnesto foi produzido em 2022 e tem a direção de Felipe Moraes, que é editor e diretor, graduado em Cinema e Audiovisual pela UFS. O filme oferece um olhar autêntico sobre o Carnaval de Aracaju desde o século XIX até os tempos atuais. Tem muita festa de rua, casos e histórias pouco conhecidas que marcaram época e que comprovam que, sim, Aracaju sempre teve Carnaval.
É claro que jogar luzes sobre essa história quase invisível é também enfrentar o contexto e as dificuldades vividas pela banda para a realização do bloco “Vem ni mim Arnesto”. Sim, a banda sergipana foi consagrada pelo famoso bloco de rua “Vem ni mim Arnesto”.
Samba do Arnesto, que tem o nome de uma das canções do sambista Adoniran Barbosa, foi fundada em 2012 com o objetivo de pesquisar e divulgar as raízes do samba brasileiro em Sergipe. Rafael Oliva, Roque Sousa e João Alberto D´Lins se juntaram e resolveram fazer releituras de grandes clássicos do samba.
Com o crescimento do projeto, o trio ganhou reforço com a chegada de Nonato Matos e Lucas Matos, que agregaram e abrilhantaram ainda mais o som da banda Samba do Arnesto. Em 2022, essa turma celebrou 10 anos de existência, um marco na história deles, que conta com participações em grandes eventos como festivais, réveillon e acumula prêmios de destaque da cultura, medalha Beatriz Nascimento da Assembleia Legislativa de Sergipe.
Este ano, o Samba do Arnesto registrou uma grande conquista. A Lei Municipal n° 5761 reconheceu o Bloco “Vem Ni Mim, Arnesto” como Patrimônio Cultural Imaterial da cidade de Aracaju. O pessoal também está se preparando para lançar o disco autoral “A Sabedoria Generosa do Samba”.
Compareça no lançamento do filme-documentário
O lançamento do filme-documentário “Sem corda, sem abadá e sem vergonha – Uma história de carnaval e resistência pelas ruas de Aracaju” será no próximo dia 28, um sábado, às 17h30 no Cine Vitória, no Centro de Aracaju. Os ingressos já estão à venda AQUI (https://www.sympla.com.br/evento/sem-corda-sem-abada-e-sem-vergonha-o-filme/2198937)
Sobre o diretor: Felipe Moraes, editor e diretor, graduado em Cinema e Audiovisual pela UFS. Desde 2012 atua em projetos de documentários, filmes institucionais, campanhas em TV, redes, musicais e performances multimídia. Dirigiu os curtas documentais “De Tudo Um Pouco Sabia Costurar” (2022), “Visagens da Calma” (2019), “Dom Quixote Sergipano” (2018). Além de ter colaborado nos últimos anos também como cinegrafista de videoclipes e curtas-metragens.
Ficha técnica do documentário: Osvaldo Neto, Bel Nunes, Luiz Eduardo Oliva, Lucas Luis, Roque Sousa, Rafael Oliva, Lucas Matos, João Alberto D’Lins, Nonato Matos. Produção: Samba do Arnesto. Roteiro: Roque Sousa. Direção e Edição: Felipe Moraes. Direção de Fotografia: Dominique Mangueira. Assistente de Fotografia: Aquiles Castro. Produção Executiva: Roque Sousa e Rafael Oliva. Assistente de Produção: Jéssica Lieko. Câmeras: Dominique Mangueira, Aquiles Castro, Felipe Moraes. Imagens de Drone: Eduardo Freire. Som Direto: Aquiles Castro. Cor: Felipe Moraes. Arte Final: Júlia Bezerra Cruz.
VEJA AQUI O TRAILER OFICIAL DO FILME