Movimento negro em Sergipe divulga carta sobre urgência do combate ao racismo e à intolerância religiosa

Liberdade religiosa é direito garantido pela Constituição (Crédito: Pabulo Henrique e Deloer Jr)

Mais de 68 organizações e ativistas do movimento negro em Sergipe e que compõem a Rede de Matriz Africana (Rema) assinaram e divulgaram uma carta pública que cobram dos órgãos ações de urgência para a implementação de um pacto estadual de combate ao racismo e à intolerância religiosa.

“Constatamos com profunda preocupação a persistência e, em muitos casos, o recrudescimento do racismo em suas diversas formas, especialmente o racismo cultural e religioso, em nosso estado e em todo o país. As comunidades de matriz africana continuam a ser alvo de discriminação, invisibilidade, desrespeito e, em situações alarmantes, de violência e criminalização de suas práticas religiosas e culturais”, informaram os integrantes da Rema.

O pacto combate ao racismo e à intolerância religiosa em Sergipe, defendido pelas organizações e ativistas, pode representar um instrumento muito importante de articulação de esforços entre poder público, sociedade civil organizada, instituições de ensino, órgãos de segurança e todos os cidadãos e cidadãs comprometidos com a justiça social e a promoção da diversidade.

Segundo a Rema, o pacto estadual combate ao racismo e à intolerância religiosa precisa contemplar, de forma prioritária: educação e conscientização, fortalecimento dos mecanismos de denúncia e proteção, políticas públicas de valorização e proteção do patrimônio material e imaterial das comunidades de matriz africana, incluindo terreiros, espaços de culto, manifestações culturais e saberes tradicionais. O pacto ainda deve ter o fomento ao diálogo inter-religioso e intercultural, o monitoramento e avaliação das ações implementadas no âmbito do pacto, com a participação da sociedade civil, garantindo a efetividade das políticas e a continuidade da luta antirracista; e orçamento adequado.

Membros da Rede de Matriz Africana pedem participação de toda sociedade (Crédito: Divulgação)

Leia a seguir a íntegra da Carta de Sergipe e veja quem assina o documento:

CARTA DE SERGIPE

PELA UNIDADE, CONTRA O RACISMO E A INTOLERÂNCIA RELIGIOSA

Nós, representantes da Rede de Matriz Africana (REMA) e participantes do Encontro Estadual realizado no Centro de Criatividade em Aracaju/Sergipe, no dia 12 de abril de 2025, reunidos sob a força ancestral que nos guia e a convicção de um futuro mais justo e igualitário, tornamos pública esta Carta de Sergipe, que expressa as reflexões, os anseios e as deliberações deste importante encontro.

Análise da Conjuntura Antirracista:

Constatamos com profunda preocupação a persistência e, em muitos casos, o recrudescimento do racismo em suas diversas formas, especialmente o racismo cultural e religioso, em nosso estado e em todo o país. As comunidades de matriz africana continuam a ser alvo de discriminação, invisibilidade, desrespeito e, em situações alarmantes, de violência e criminalização de suas práticas religiosas e culturais.

Observamos que a desinformação, os estereótipos negativos e a falta de conhecimento sobre a rica história e contribuição das culturas afro-brasileiras perpetuam um ciclo de preconceito que impede a plena realização da igualdade racial e religiosa. A laicidade do Estado, princípio fundamental da nossa República, é frequentemente negligenciada, permitindo que a intolerância religiosa se manifeste de maneira explícita ou velada, ferindo direitos constitucionais e a dignidade humana.

Reconhecemos os avanços pontuais em algumas áreas, fruto da luta histórica dos movimentos sociais e de indivíduos comprometidos com a causa antirracista. No entanto, é inegável que a conjuntura exige ações mais contundentes, coordenadas e efetivas para desconstruir as estruturas racistas que ainda permeiam nossa sociedade.

Centralidade do Pacto Estadual de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa:

Diante deste cenário desafiador, o Encontro Estadual da REMA reafirma a urgência e a centralidade da construção e implementação de um PACTO ESTADUAL DE COMBATE AO RACISMO E À INTOLERÂNCIA RELIGIOSA em Sergipe. Entendemos que este pacto representa um instrumento fundamental para articular esforços entre o poder público, a sociedade civil organizada, as instituições de ensino, os órgãos de segurança, demais equipamentos das políticas públicas estatais e todos os cidadãos e cidadãs comprometidos com a justiça social e a promoção da diversidade.

Este Pacto Estadual deve contemplar, de forma prioritária:

 1. Educação e Conscientização: Implementação de programas educacionais efetivos, em conformidade com a legislação que abordem a história, a cultura e a religiosidade afro-brasileira em todos os níveis de ensino, visando desconstruir estereótipos e promover o respeito à diversidade.

1.1. Transparência do mapeamento e diagnóstico das atividades referentes à efetiva aplicação da Lei 10.639/03;

1.2. Realização de concurso público para docente como forma de assegurar a estabilidade necessária para cumprimento da política pública prevista na Lei 10.639/03;

1.3. Capacitação e formação continuada dos trabalhadores da educação;

2. Fortalecimento dos Mecanismos de Denúncia e Proteção: Criação e ampliação de canais seguros e eficazes para denúncias de racismo cultural e religioso, garantindo o acolhimento, a investigação rigorosa e a punição dos responsáveis, além de oferecer apoio jurídico e psicossocial às vítimas.

2.1. Obrigatoriedade da inclusão de letramento racial e política antirracista no cronograma dos cursos de formação, atualização e capacitação de agentes de segurança pública (policiais e bombeiros militares, oficiais e praças, policiais civis, delegados de polícia, policiais penais, agentes socioeducativos e as guardas municipais), a serem construídos e ministrados com a participação da sociedade civil organizada com legitimidade junto às comunidades tradicionais quilombolas, povos tradicionais, de matrizes africanas e terreiro.

3. Políticas Públicas de Valorização e Proteção: Desenvolvimento e implementação de políticas públicas que reconheçam, valorizem e protejam o patrimônio material e imaterial das comunidades de matriz africana, incluindo terreiros, espaços de culto, manifestações culturais e saberes tradicionais.

4. Fomento ao Diálogo Inter-Religioso e Intercultural: Criação de espaços de diálogo e intercâmbio entre diferentes tradições religiosas e culturais, promovendo o entendimento mútuo, o respeito e a construção de uma cultura de paz.

5. Monitoramento e Avaliação: Estabelecimento de mecanismos transparentes de monitoramento e avaliação das ações implementadas no âmbito do pacto, com a participação da sociedade civil, garantindo a efetividade das políticas e a continuidade da luta antirracista.

6. Orçamento Adequado: Destinação através dos meios legais de chamamentos, prêmios, editais, fomentos de recursos financeiros adequados para a implementação das ações previstas no pacto, previstos nos orçamentos, demonstrando o compromisso do poder público com o combate ao racismo e à intolerância religiosa.

Chamado à Ação:

Conclamamos os Poderes Executivos estadual e municipais, os Poderes Legislativos Estaduais e Municipais, o Poder Judiciário, o Ministério Público, as universidades, as organizações da sociedade civil e toda a população sergipana a se unirem a nós na construção e efetivação deste PACTO ESTADUAL DE COMBATE AO RACISMO E À INTOLERÂNCIA RELIGIOSA. Acreditamos que somente através de um esforço coletivo e contínuo será possível superar o legado do racismo e construir uma sociedade mais justa, fraterna e verdadeiramente diversa.

Que a sabedoria ancestral de nossos mais velhos e a força da nossa união nos inspirem nesta caminhada.

Axé!

Aracaju/Sergipe, 12 de abril de 2025.


Assinam esta Carta:

1. Instituição de Tradições e Cultura Afro Brasileira São judas Tadeu

2. REMA – Rede de Matriz Africana

3. REMMA – Rede de Mulheres de Matriz Africana

4. JUREMA – Juventude da REMA

5. CONEN – Coordenação Nacional de Entidades Negras

6. Bloco Afro Quilombo

7. NEABI UFS- Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas da Universidade Federal de Sergipe

8. RMSE- Rede de Mulheres Negras de Sergipe

9. Fórum de Entidades Negras de Sergipe

10. Fórum Sergipano das Religiões de Matriz Africana

11. Ponto de Cultura São Cosme e São Damião – Boquim-SE

12. Ilè Asè Obe Fara – Aracaju-SE

13. Ilê Axé Oxóssi das Matas – São Cristóvão-SE

14. Mandato Vereador Iran Barbosa

15. Coletivo A Rua – Aracaju-SE

16. Templo Escola Jardim dos Orixás – Aracaju-SE

17. Asè Egbè Sergipano (Coletivo de Terreiros de Sergipe)

18. Trupe Sol Lá Circo

19. Coletivo HECTA – Aracaju- SE

20. Casa Nagô – Aracaju-SE

21. CMP – Central de Movimento Popular de Sergipe

22. ADUFS – Associação dos Docentes da Universidade de Sergipe

23. CUT – Central Única dos Trabalhadores

24. CONAQ – Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas

25. ABAÔ – Grupo Abaô de Capoeira Angola

26. Rev. Alexandre de Jesus dos Prazeres – IPU.

27. Carlos Alexandre Miguel de Souza – Radialista e Repórter Fotográfico

28. Associação Religiosa Centro Espírita de Umbanda Seara dos Orixás- Estância-Sergipe.

29. Associação Remanescente de Quilombo da Comunidade Curuanha e Circunvizinhas de Estância/SE.

30. Associação da comunidade de remanescente de quilombo do Brejão dos negros Santa Cruz

31. FÓRUM DE POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS DE SERGIPE

32. Associação Quilombola do Crasto- Território Luziense

33. Associação de moradores do loteamento senhor do Bonfim

34. Associação dos Remanescentes de Quilombo Dona Paqueza Piloto de Caraíbas

35. Associação comunitária Remanescente de quilombo de Lagoa grande Siriri

36. Associação do território dos remanescentes de quilombo mocambo Aquidabã.

37. Associação Santa cruz remanescente de quilombola do povoado forras

38. Associação quilombola Patioba

39. Associação Dom José Brandão de Castro

40. Ilé Àsè Alaketu Ègbè Ala Pilão de Elejíbômin – Laranjeiras/SE

41. Associação Quilombola da rua dos Negros.

42. Associação Quilombola da rua dos Negros.

43. Comunidade Quilombola Pirangi em Capela

44. Associação Comunitária da Comunidade Remanescente de Quilombo João Almeida da Silva a. Cumbe Sergipe

45. Associação Territorial Quilombola Mestre Primo

46. Centro Cultural Erukerê Nganga Lunga

47. AJD – Associação Juízas e Juízes pela Democracia – Núcleo BaSe

48. ABJD – Associação Brasileira de Juristas pela Democracia- Núcleo Sergipe

49. MNDH – Movimento Nacional de Direitos Humanos

50. Mandata da Vereadora Sônia Meire

51. Movimento Nacional ODS Sergipe,

52. CEIFSJ – Centro Espírita Irmãos pela Fé em São Jorge/Terreiro Ogum e Orixálá – Babá Marçal – Salgado/Se.

53. Ilê Axé Ogum Talande – Laranjeiras/Se

54. REAÇÃO

55. Tonho Baixinho – Músico, cantor e compositor

56. Comitê Estadual de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes

57. Instituto Braços- Centro de Defesa dos Direitos Humanos em Sergipe

58. Casa da Juventude Irmão Salatiel Francisco do Amaral – Propriá/Se.

59. Associação Religiosa de Prática ao Culto Afro Brasileiro em Rito ao Culto aos Orixás Coura gandessy Bamire – Povoado Caraíbas de Cima – Simão Dias/Se.

60. CLAUDIA OLIVEIRA SANTOS – Militante.

61. MNU/SE – Movimento Negro Unificado – Sergipe

62. XOCÓS-Associação Sergipana de Autores e Interpretes Musicais Independentes

63. Ilé Axé Xango Lewí – Santo Amaro das Brotas/Se

64. Ilé Axé Iansã Balecidé – Santo Amaro das Brotas/Se

65. Mandato do Deputado Estadual Chico do Correio

66. Associação religiosa Asè fàdaká ofá MACAMBIRA SERGIPE

67. CRILIBER

68. Grupo de Estudos GERRB

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