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Mangue não usará Inteligências Artificiais para fazer jornalismo

A Mangue Jornalismo entende que, neste momento, a utilização deliberada de Inteligências Artificiais (IAs) para propor a compreensão do mundo pode comprometer o compromisso inabalável do jornalismo com a verdade.

A Mangue Jornalismo discute e acompanha com preocupação a utilização das Inteligências Artificiais (IAs) em organizações jornalísticas.

Hoje, muitas organização têm usado largamente as “facilidades” prometidas pelas IAs na construção de pautas, para apurar, organizar dados, copiar ideias, palavras, textos em parte e inteiros e até para gerar imagens, tudo de modo artificial.

Até agora, não há nenhum tipo de regulamentação nem parâmetros de confiança largamente adotados para a utilização das IAs no contexto jornalístico.

Alguns veículos independentes e outros tradicionais até elaboraram critérios para o uso desses sistemas artificias, prometendo informar ao público que utilizam as IAs e que não abrem mão da ação humana no produto final.

Para a Mangue Jornalismo, a inexistência de referências e informações seguras sobre o uso de IAs neste momento impõe ao ambiente jornalístico um quadro de vulnerabilidade que pode afetar a centralidade do seu compromisso incontornável com a verdade.

Ao utilizar deliberadamente uma IA, podemos garantir que aquilo proposto ao público como jornalismo será mesmo um esforço para a expressão da realidade?

A mediação de parte do mundo construída na artificialidade pelo jornalismo assegura que um acontecimento de fato existiu ou existe? Ou a artificialidade da ação e do que nascerá como texto ou imagem jornalística pode suscitar dúvidas sobre a veracidade dele?

As imagens de pessoas ou de eventos noticiados construídos a partir de comandos para as Inteligências Artificiais são reais e referenciados na realidade ou não existem, sendo apenas uma colagem artificial de imagens, dados e números recombinados por computador?

Não temos respostas seguras para essas questões.

A Mangue não é contra a tecnologia e jamais poderia ser, pois se trataria de uma contradição vital na medida em que esta organização nasce justamente no ambiente digital.

As Inteligências Artificiais se apresentam com grande potencial de aceleração gigante de processos, constituindo um ambiente de estudo, observação, experimentação, testes, reflexões. A Mangue não abre mão de lidar com as novidades, não vamos perder a curva de aprendizado com elas, mas dentro de parâmetros éticos seguros.

Em uma primeira angulação, o uso das IAs no jornalismo tende a promover uma grave precarização das atividades profissionais, o desrespeito aos direitos autorais, gerando dependência produtiva, alteração de decisões editoriais para atender algoritmos, e produzindo o contrário da promessa: a desinformação.

Assim, consideramos que o uso acrítico das IAs no jornalismo amplia a grave crise que passa o jornalismo, uma crise que não é apenas tecnológica, mas centralmente de credibilidade. Chegamos nesse ponto, em grande parte, em razão do longo aprisionamento e da deformação do fazer jornalístico por empresas tradicionais de mídia para atender seus interesses econômicos e políticos.

Para a Mangue, as IAs, especialmente a IA “generativa” não cria, sendo apenas a mescla de um grande número de referências captadas sem a autorização dos autores do conteúdo. Essa apropriação deformativa ocorre de maneira a alimentar a precarização de quem de fato trabalha.

Insistimos que somos defensores e festejamos as várias tecnologias empregadas na vida, inclusive no jornalismo. Porém, neste momento, entendemos que usar acrítica e deliberadamente as IAs no fazer jornalístico cotidiano pode corroer a cláusula pétrea do jornalismo: seu compromisso vital com a verdade.

Infelizmente, as práticas de mídias jornalísticas centradas em outros compromissos que não asseguram a verdade já têm comprometido a base central do jornalismo.

A utilização sem quaisquer freios das IAs nas redações pode reforçar um ambiente onde a verdade – razão de ser do jornalismo – estará sempre em modo suspenso, o que é uma tragédia do ponto de vista das relações com os públicos e da própria existência do jornalismo.

Utilizar as IAs e informar ao público que as utiliza é importante e fundamental, mas essa ação aumenta a confiança no jornalismo ou lança uma centelha de dúvida sobre o real e o artificial?

Se em algum momento a Mangue optar pelo uso das IAs ou se descobrir que usou alguma ferramenta sem ter noção de que era algo que se vale de IA, é obrigação informar ao público. Entretanto, todos os esforços serão pela não utilização das Inteligências Artificiais de modo deliberado.

Lembremos que para a Mangue, o jornalismo é um processo de relação que se dá antes, no meio, e depois da pauta, da produção e da apresentação dos conteúdos. “Se o mundo é real, por que o jornalismo tem que ser artificial? Os textos, as imagens, o jornalismo da Mangue sempre serão humanos e reais”, defende Cristian Góes, coordenador da organização.

O propósito da Mangue é apresentar, de modo regular, conteúdos de qualidade e que são resultado de investigação jornalística humana, trazendo à luz da realidade os acontecimentos e as histórias de pessoas, principalmente aquelas em invisibilização nas mídias tradicionais.

Nosso jornalismo é pautado pela busca insistente da verdade, independência, ética, transparência e compromisso fundamental com o interesse público em todas as temáticas atravessadas pelos direitos humanos.

Acreditamos que o jornalismo se realiza na relação entre jornalistas e públicos, mediados por intensa escuta, diálogo, como disse Paulo Freire (1975), como num encontro de sujeitas e sujeitos que constroem coletivamente o conhecer para transformar as realidades, geralmente opressoras.

Nesse sentido, por enquanto, a Mangue Jornalismo deixa público que não vai utilizar deliberadamente as IAs para criação de textos, produção de imagens e conteúdos audiovisuais, seja para o site ou para quaisquer outros canais oficiais da Mangue (redes sociais, por exemplo) ou em comunicações oficiais (relatórios, balancetes, comunicados e afins).

Esta manifestação sobre as IAs na Mangue estará sempre aberta para receber contribuições que possam permanentemente gerar mais debates e estudos. E como a transparência é um dos pilares da Mangue, qualquer alteração nesse posicionamento será publicizada para o público.

Mangue Jornalismo
Aracaju, agosto de 2024

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