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A Serra de Itabaiana pede socorro. O Parque Nacional vem sofrendo com visitas desordenadas, acúmulo de lixo, falta de sinalização e de fiscalização

CAMILA FARIAS, da Mangue Jornalismo

O Rio das Pedras é um povoado que margeia a Serra de Itabaiana, localizada há cerca de uma hora de Aracaju. A serra conta com 8.024,79 hectares, o que equivale a mais de 7.500 campos de futebol. Nela está localizado também o segundo maior ponto mais alto do estado de Sergipe, com 659 metros de altitude.

Do tamanho total da área que compreende a serra, mais de 70% estão vinculados ao município de Areia Branca e o restante compreende os municípios de Itabaiana, Laranjeiras, Itaporanga D’Ajuda e Campo do Brito.

Grande parte da Serra de Itabaiana não fica em Itabaiana (Foto Camila Farias)

Atualmente, a entrada oficial é pelo Parque Nacional, que é administrado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e conta com um controle de visitantes. Porém, poucos metros à frente, há um povoado e por lá, há duas possíveis entradas que estão sendo exploradas por moradores e agências de turismo.

Esses dois caminhos dão acesso a outras cachoeiras que estão dentro da área do parque. Além disso, alguns pontos nessa reserva federal sofrem com visitas desordenadas, despejo de resíduos no local, falta de sinalização e fiscalização.

Para a visita ao Parque Nacional Serra de Itabaiana, a Mangue Jornalismo foi acompanhada por uma condutora do local e por Elias Silva, que é o presidente da ONG Centro da Terra.

Atuação da Centro da Terra na preservação do parque

A ONG Centro da Terra tem sido uma ativista desde 2002 e volta suas pautas para a preservação ambiental. Em junho deste ano, a entidade assinou um termo de cooperação com o ICMBio que terá duração de dois anos e prevê diversas ações voltadas à sustentabilidade do parque.

A primeira ação da parceria compreende a realização de um curso para capacitar inicialmente 15 condutores locais. Ele será realizado a partir de dezembro em parceria com o Governo do Estado, por meio da Secretaria do Turismo (Setur), sendo custeado no valor de R$ 18 mil. Um dos módulos envolve o manejo e manutenção de trilhas, assim como a sinalização.

A ideia é capacitar condutores locais para aumentar a empregabilidade na área. “Temos que contemplar economicamente as pessoas da comunidade. Muitas vezes, essa comunidade não está inserida na cadeia produtiva do turismo. Temos que dar esse protagonismo, pois elas são detentoras do conhecimento local”, explica Elias Silva, da Centro da Terra.

A parceria feita com o ICMBio prevê também a instalação de placas para a sinalização do local, o que hoje não existe em boa parte do parque. “A ideia é fazer um manejo das trilhas e inserir sinalizações a partir do padrão nacional, que é da Rede Brasileira de Trilhas. O trabalho da ONG vai ser percorrer os pontos que precisam sinalizar. A trilha é um impacto ambiental positivo, pois serve para minimizar impactos negativos”, completa Elias.

A sinalização vai envolver tanto aspectos direcionais para o visitante, como informativos e interpretativos, o que pode contribuir para aspectos culturais. Atualmente, o parque conta com várias trilhas irregulares e que são afetadas pelo pisoteamento desordenado. Além disso, há pouca sinalização no local.

A busca difícil por parceiras com prefeituras

O curso de condutores para comunidades locais é comercializado pela ONG e custa em torno de R$ 30 mil reais para as prefeituras. Para quem participa, é gratuito. Porém, Elias explicou que apesar de tentar oferecer o curso para várias prefeituras, muitas delas não se interessaram.

“A ONG não tem autonomia financeira. A prefeitura sempre alega que não tem dinheiro. O curso tem em torno de três meses, ensinamos sobre o manejo da trilha, capacitação dos condutores locais e saímos do município com um pessoal capacitado”, pontua Elias. Ao não realizar o investimento no curso, Elias explica que a população do município é quem perde.

“Estamos falando de um elemento turístico de um município que não está estruturado. Você perde para a economia local, as agências da capital vão explorar e ficar com todo o dinheiro. Quando falamos sobre inserir a comunidade, isso vai desde capacitar condutores locais até pessoas que poderão vender alguns alimentos. Falamos sobre uma trilha manejada e correta. Se não tem isso, logo esse local vai está degradado e aí os visitantes perdem o interesse. A comunidade continua não ganhando nada”, aponta Elias.

A condutora, que não quis se identificar, comentou que isso ocorre porque muitas vezes, as prefeituras têm outras prioridades e não investem no turismo. ” Falta reunir a comunidade e mostrar o potencial que esse local tem. Se você chegar no povoado Rio das Pedras, vai ter muita coisa vendendo, mas aqui na entrada no parque não vendem nem água porque não entendem o potencial turístico”, pontua a condutora.

ONG busca parceiras para ajudar na preservação do parque (Foto Camila Farias)


População carece de educação ambiental

Durante a visita à Serra de Itabaiana, além dos problemas que envolvem a falta de sinalização e fiscalização por parte dos agentes governamentais, há problema do despejo irregular de lixo e outras irregularidades que são cometidas pela população e por agências de turismo.

Um dos exemplos é que não é permitido acender fogueiras, mas havia um grupo de pessoas praticando essa ação. Isso vale também quando se fala sobre levar animais domésticos para esses espaços, o que não é permitido dentro do parque nacional.

No local, inclusive, foi encontrado um grupo que estava com dois cachorros. “Quando falamos sobre um animal que não é silvestre nesse ambiente, isso é muito grave. Por exemplo, se ele defecar, pode ter parasitas que são específicos dele e a fauna local que não está preparada para isso. As pessoas acham que é maldade e que queremos proibir porque não gostamos de cachorro. Não é isso”, comenta Elias.

Durante a trilha para o Poço das Moças, encontramos uma fogueira no local e a presença de fiscais do ICMBio. Alisson Santos, que é agente ambiental explicou que “nosso trabalho é orientar as pessoas a não jogar lixo, não entrar com animais ou acender fogueira”. Porém, mesmo com as recomendações, Miguel Monteiro, seu parceiro de trabalho, lamentou que “falamos que não é para acender, mas o pessoal sempre acende. Ninguém respeita”.

Elias explicou que existe uma dificuldade em lidar com algumas pessoas da comunidade. “É um trabalho de educação ambiental que precisa ser feito para tirar essa ideia de que é meu quintal e por isso, posso fazer o quê quero”.

Para isso, ele acredita que a formação de condutores locais afeta positivamente a comunidade. “Se eu chego com uma pessoa da comunidade, sou ouvido mais fácil.” Mas, esse é um longo trabalho e existe esse trabalho de inserção na comunidade.

Um problema apresentado pela condutora e por Elias é que algumas agências de turismo tentam se promover em relação a recolher o lixo, mas em alguns casos há campanhas que levam 200 pessoas na trilha e traz um grande impacto, pois a trilha não tem capacidade para receber tantas pessoas ao mesmo tempo.

“É possível que o cidadão faça denúncias no ministério público, caso encontre alguma irregularidades ambiental. Inclusive, a denúncia pode ser anônima”, aponta Elias.

Noel Almeida de Jesus, que é condutor há 25 anos na serra, explica que existe um excesso de visitantes para um lugar com trilhas pequenas. “Com muitas pessoas frequentando de forma desordenada, surge muito lixo e uma degradação das trilhas”. Para ele, o caminho passa pela educação ambiental e deve iniciar nas escolas. “É fundamental mostrar para as crianças como cuidar da natureza. Tenho certeza que isso daria resultados positivos”, defendeu Noel.

Falta de segurança também é um problema na Serra de Itabaiana

Um dos problemas é a falta de segurança no local. Inclusive, uma das condutoras que acompanhou a equipe, não quis se identificar por medo. Ela explicou que no local uma problemática é voltada ao número de assaltos. “Não há guarda municipal em Areia Branca e há pouco efetivo de pessoal em Itabaiana”, aponta a condutora. Dessa forma, ela explica que seria importante contar com o apoio do Estado, por meio da Polícia Militar.

Além disso, ela explica que muitas pessoas não registram boletim de ocorrência e por isso, é complicado quantificar o número de ocorrências.

A Polícia Militar, por meio do 3º Batalhão e do tenente coronel Anselmo, informou que realiza rondas na serra, principalmente nos acessos que permitem o acesso à viatura, a exemplo do Poço das Moças.

“Na trilha não é possível porque não conseguimos acesso com a viatura. Pedimos que os organizadores de passeio nas trilhas nos envie um ofício, informando o dia e horário, para monitorarmos e até mesmo, fazermos um resgate, caso seja necessário”, pontua o tenente coronel.

A Prefeitura de Itabaiana informou que a Secretaria Municipal da Ordem Pública envia periodicamente a “Guarda Municipal” para fazer ronda em toda área. Não foi informado ao certo quantos dias são equivalentes ao termo “periodicamente”.

Falta de segurança também é um problema na serra (Foto Camila Farias)


Existem propriedades privadas dentro do Parque Nacional

Há algumas propriedades privadas dentro do parque que ainda não foram desapropriadas pelo Governo Federal. Ou seja, existem pessoas que têm moradia e área no parque que ainda não foram remuneradas para sair do local. Segundo Elias, o prazo do Governo para desapropriar já expirou, mas esse não é um problema exclusivo da serra.

Além desse problema, há hectares na Serra de Itabaiana que estão fora da demarcação da área do parque, mas, por serem margeadas pelo rio, fazem parte de áreas de proteção ambiental. Nesses locais, a vegetação nativa e matas ciliares precisam ser mantidas, mas essa não é a realidade, já que ocorrem atividades de agricultura irrigada no local.

“Quando há remoção de vegetação, o solo fica exposto. O solo está sendo irrigado, mas não há contenção dele, isso vai escoar e pode causar assoreamento do rio, assim como de erosão do solo. O dono do local também pode utilizar agrotóxicos, o que causa contaminação no local “, explica Elias.

Sob esse problema, entramos em contato com a Administração Estadual do Meio Ambiente (Adema), que é responsável por essas fiscalizações. Até o momento da publicação dessa reportagem, não obtivemos respostas.

Mangue aguarda posicionamento de outros órgãos públicos

A Mangue Jornalismo entrou em contato com o ICMBio para questionar sobre as ações realizadas no parque, assim como a falta de sinalização em alguns pontos. Também foi questionado em relação à parceria com a ONG Centro da Terra. Até o momento, não obtivemos resposta.

Sobre os problemas apresentados na reportagem, questionamentos sobre o papel das Prefeituras de Itabaiana e Areia Branca, que detém o maior percentual de área da serra.

A Prefeitura de Itabaiana, em nota, informou que “apesar do Parque Nacional Serra de Itabaiana está sob a responsabilidade do ICMBIO, que é responsável por gerir, proteger, monitorar e fiscalizar a área total do Parque Nacional Serra de Itabaiana, o município envia periodicamente uma equipe de limpeza para recolhimento do lixo na área, a Secretaria da Indústria, do Comércio e do Turismo colocou placas de orientação aos visitantes e faz visitas técnicas periódicas”

 Porém, no trajeto percorrido pela Mangue só foi vistas placas do ICMBio. A Prefeitura de Areia Branca não retornou nossas solicitações até o momento.

A Secretaria de Turismo de Sergipe também foi contatada, mas também não retornou até o fechamento da reportagem. Caso envie repostas, a reportagem será atualizada.

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