Podcast Griô do Amanhã enterra o patriarcado e constroi um futuro ecofeminista

O patriarcado foi diagnosticado como uma represália. O mundo evoluiu e deixou para trás essa máquina produtora de hecatombe. Agora, as forças naturais e sociais são uma só, e o ecofeminismo se designa como uma entidade necessária para o bem comum.

O Podcast “Griô do Amanhã” traz a proposta de criar um mundo utópico em que a sociedade vive em harmonia dentro das políticas sociais ecofeministas, com a inclusão e o debate sobre raça e gênero. O futurismo criado pelo podcast não tem nada a ver com carros voadores, robôs que vivem como humanos ou civilizações em outros planetas. É um futuro que deseja o fim da violência que extermina.

Na diegese do podcast, as crianças Tiê, Jaci e Eli encontram um pendrive, que para eles, que vivem no ano de 2250, é um objeto estranho. Ao tentar decifrar a mensagem que contém dentro daquele aparelho, os jovens vão acompanhar a Moira, uma importante Griô atemporal, em um mergulho sobre a história da humanidade por meio do “Museu do Patriarcado”.

Utilizando-se da memória, o “Griô do Amanhã” constrói a sua narrativa em volta desse lugar físico para lembrar o que aconteceu nos tempos passados, servindo como um alicerce de reflexão e estudos para que não venha a se repetir. Dentro do “Museu do Patriarcado”, os jovens vão ter contato com falas misóginas e racistas, principalmente de políticos que instigaram discursos de ódio em suas campanhas.

Idealizado por Aline Souza, Júlia Cohen e Karla Martins, a produção do podcast conta com pessoas que vão desde o Brasil até a Argentina e que acreditam que é possível sonhar com um mundo em que o patriarcado virou passado.

“Na minha concepção, esse podcast é um grão de areia, mas eu acho que é um grão de areia dentro de uma grande barca, de uma grande toada de pessoas que estão realmente interessadas em fazer algo com essa imaginação frutífera que nós temos e que nós somos capazes de encontrar saídas”, falou Aline Souza.

O podcast surgiu a partir da iniciativa Tertúlias Ficção, com a realização do Instituto Toriba e apoio do IRIS, como parte da formação para realizadores, criativos e artistas. Os temas que foram abordados no projeto vieram da indignação que foi gerada com a votação do Projeto de Lei 1904/2024, conhecido como PL do Aborto, que tem o objetivo de equiparar o aborto realizado após 22 de semanas de gestação a um homicídio simples, os casos também incluem a gestação oriunda de um estupro. “O tema do aborto é uma coisa muito polêmica no nosso país. Então, como é que a gente sai desse lugar da militância propriamente dita e vai pra um lugar onde realmente tem uma espécie de atrair as pessoas, de um encantamento? Afinal de contas, a gente estava falando de perspectivas de futuro”, disse Aline.

Com o foco na imaginação, o podcast traz episódios de ficção e não-ficção (Crédito: Michele Gomes/Divulgação).

Com o incômodo sendo comum em todas as idealizadoras, surgiu a necessidade de descobrir uma forma de contar uma história que mostrasse as revoltas sentidas em um mundo capitalista e patriarcal. Dentre muitas pesquisas e discussões, Aline conta que a ideia de uma contadora de histórias que visita um museu do patriarcado, veio por meio do seu sonho.

“Eu acabei sonhando com a perspectiva de uma mulher sábia que estaria à frente de um grupo de jovens, contando pra esse grupo de jovens como seria uma sociedade sem o patriarcado, uma sociedade onde os direitos das mulheres fossem respeitados e que não havia mais essa grande polêmica que envolve a questão dos direitos reprodutivos”.

A primeira temporada do podcast contará com quatro episódios de ficção futurista e seis episódios de entrevistas com pessoas do nosso tempo real, como conta Aline. Dentre as entrevistadas, estão Márcia Tiburi, filósofa e autora do livro “Feminismo em Comum”, Neidinha Suruí, ativista dos direitos humanos e do meio ambiente, e Áurea Carolina, ex-deputada federal por Minas Gerais.

O podcast “Griô do Amanhã” está disponível nas principais plataformas digitais de áudio. Aqui você escuta pelo Spotify. Mais informações pela conta do Instagram em @griodoamanha_podcast

A superação do patriarcado e do capitalismo

Existem alguns estudos que estimam quanto tempo levaria para o mundo atingir a igualdade de gênero. Em 2023, a ONU Mulheres revelou que esse tempo é de 300 anos. No levantamento realizado pelo Fórum Econômico Mundial de 2023, o mundo deve levar cerca de 130 anos para atingir a igualdade de gênero no mercado de trabalho. No entanto, na pesquisa divulgada em 2019, o tempo estimado era de 257 anos, uma redução de quase 50%.

“Se a gente vai levar cerca de 150 anos para chegar a esse nível de igualdade que a gente quer ver na sociedade, então, a gente já vai pular para lá e já vai trazer uma sociedade que já está lá. Esse lugar, ele é o Griô do Amanhã. É esse lugar onde já existe uma revolução ecofeminista e que a gente já fez esse trabalho árduo, destruiu o capitalismo, destruiu o patriarcado. E existem outras relações, outro vocabulário, outra cosmovisão de mundo em relação à nossa conexão com a natureza, em relação com as nossas relações afetivas”, explicou Aline.

Para além dos áudios, a equipe por trás do projeto desenvolveu o “Dicionário do Futuro” específico para a época em que passa a história de Tiê e seus amigos. Palavras como “amareza”, que quer dizer o amor das relações com pessoas pouco conhecidas, ou “aterreza”, que significa a ideia de estar com os pés no chão, uma motivação para a tomada de decisões mais conscientes.

Outro instrumento desenvolvido foi a “Linha do Tempo”, em que mostra todo o percurso feito na sociedade até chegar na revolução ecofeminista. Nela inclui as importantes lutas dos movimentos sociais, raciais, identitários e ambientalistas. A Linha do Tempo serve como uma ferramenta para discutir passos para a conquista de um mundo mais igualitário.

O podcast “Griô do Amanhã” nasce como um impulsionador de esperanças, que instiga o pensamento crítico sobre os modos em que vivemos hoje. Segundo as idealizadoras, é com esse produto que elas podem entregar para a sociedade uma nova reflexão sobre como seria esse mundo em que as pessoas não são mortas por apenas existirem.

“A gente quer fazer essas encruzilhadas, a gente quer provocar essas imaginações para dizer que não estamos fadadas à extinção, a gente pode e deve buscar outros caminhos baseados sim na ancestralidade, baseado na nossa criatividade, no nosso poder criativo e na nossa capacidade de se reimaginar e se reinventar”.

“Griô do Amanhã” utiliza simbologias ancestrais para a construção do mundo (Crédito: Michele Gomes/Divulgação).

Os temas de hoje que freiam a chegada do futuro promissor

Nos últimos meses, desencadeou nas redes sociais um movimento ultraconservador de mulheres que abdicam das suas vidas profissionais e pessoais para se dedicarem ao trabalho doméstico, as ‘Trad Wifes’.

A imagem é a seguinte: mulher branca em uma casa que aparenta ser campestre, utilizando um vestido de cor pastel com um avental por cima, ela está na cozinha preparando quilos de comidas enquanto seus filhos – sempre mais de um, algumas chegam a ter mais de cinco, ou até mesmo carregando o bebê no colo enquanto faz as tarefas – aparecem na cozinha e com um sorriso no rosto, ela conversa com o seu querido filho, caracterizando assim uma família de comercial de margarina.

Algumas mulheres utilizam esse estilo de vida para propagar uma ideia de que essa filosofia de vida é uma reafirmação do potencial da mulher em cuidar da sua casa, dos seus filhos e, principalmente, do seu marido. Por outro lado, outros criadores de conteúdo alertam que atitudes como essa, acabam romantizando a exploração e a dependência, seja financeira ou emocional, colocando sempre o homem como superior.

Neste mês foi realizado o 21º Acampamento Terra Livre (ATL), um movimento mobilizado por indígenas de diferentes territórios do Brasil em luta pela garantia dos seus direitos. A marcha, que seguiu por Brasília, contou com mais de oito mil pessoas, e um dos protestos era contra a Ferrogão, um projeto que prevê a construção de quase mil quilômetros de trilho pela Amazônia, o que causará enormes impactos sociais e ambientais.

Em meio a uma manifestação pacífica em frente ao Congresso Nacional, no dia 10, indígenas do ATL foram agredidos pela Polícia Legislativa com bombas de gás lacrimogêneo.

Partindo para a Espanha, mas sem sair do Brasil, no dia 28 de março, o ex-jogador de futebol, Daniel Alves, foi absolvido das acusações do crime de estupro. No ano de 2022, o ex-jogador foi condenado por um tribunal em primeira instância, quase três anos depois, o Tribunal de Justiça da Catalunha afirmou que os depoimentos da vítima eram insuficientes para sustentar a decisão.

O Judiciário considerou a presença de sêmem de Daniel Alves na vítima, as lesões no corpo da jovem, o comportamento ao relatar o ocorrido, a ausência de interesses econômicos e os exames feitos para a condenação em 2022. Com a inconstância dos depoimentos do ex-jogador ao longo do processo, a Justiça ainda assim afirma que é insuficiente confirmar o crime de estupro.

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