Em uma escola particular localizada no Bairro Jardins, em Aracaju, um grupo de oito estudantes entre 14 e 15 anos explicavam entusiasmados sobre como uma visita a uma área de manguezal da capital sergipana em setembro do ano passado deu origem ao Mangue Mania, projeto de educação ambiental de baixo custo pensado para aplicação entre alunos de 8 a 11 anos de idade.
A visita feita em 2024 com o acompanhamento da ONG Canto Vivo apresentou aos estudantes uma realidade ambiental que eles desconheciam, explicou o estudante Arthur Lemos, 14. Os manguezais são uma área de transição entre os ambientes marinho e terrestre e de encontro entra a água salgada e a doce, tornando-os altamente sensíveis a mudanças como aumento do nível do mar ou de sedimentos fluviais.
Além disso, as árvores características dessa vegetação – chamadas de mangues – conseguem captar mais carbono do que a vegetação de outros ecossistemas, e funcionam tanto como barreiras naturais contra o avanço dos oceanos como berçário para peixes, crustáceos e mamíferos, fornecendo alimento e fonte de renda para comunidades costeiras.
Em Aracaju, apenas 1,1% do território ainda está coberto por manguezais. O Bairro Jardins e vizinhos como Treze de Julho e Coroa do Meio foram construídos sobre áreas de manguezal aterradas. “A gente agora entende, finalmente, porque Aracaju está tão quente”, afirmou Vitor Yuji, 14, sobre o processo de estudo dele e dos colegas acerca de um dos ecossistemas mais ameaçados do mundo, cuja estimativa de degradação anual em todo o planeta é de 1%, segundo documento de 2019 da Global Mangrove Alliance.
Incomodados com as informações preocupantes que descobriram e à procura de uma ação prática com finalidade social dentro do que propõe o torneiro First Lego League (FLL), do qual participariam, os integrantes da Equipe S.H.I.E.L.D. de práticas de robótica do Centro de Excelência Master se uniram para pensar um produto educacional que funcionasse como introdução ao assunto manguezais.
Ao todo, 12 estudantes e duas professoras participaram do processo de desenvolvimento do kit Mangue Mania, cuja versão final tem sete componentes organizados dentro de uma pasta de fácil transporte e divididos em fases a serem cumpridas ao longo de 45 minutos de aula.
Uma das orientadoras do projeto, a professora de artes visuais e robótica Jacy Souza, explicou que o processo de construção metodológica do Mangue Mania teve feedback constante de pedagogos e biólogos para garantir a efetividade e precisão do que foi proposto no kit.

O material inclui cartilha informativa, plano de aula adaptável para servir como guia aos educadores, atividades individuais e em grupo – a exemplo de um jogo cujo caminho deve ser percorrido casa a casa – e certificados entregues aos alunos ao final da formação, tornando-os “guardiões do manguezal”.
Até o momento, o kit de educação ambiental foi testado em quatro turmas do ensino fundamental I das escolas municipais Prof. Laonte Gama Da Silva e Jornalista João Oliva, além do próprio Master.

Vindos de uma realidade de classe média alta e, portanto, com mais acesso a recursos que possibilitam o desenvolvimento de pesquisas e práticas educacionais voltadas a projetos, os estudantes ouvidos pela reportagem disseram entender a necessidade de levar o Mangue Mania para alunos dos mais variados contextos sociais. Segundo Victor Yuji, “o S.H.I.E.L.D. vai além da robótica”.
Com a reestruturação da Política Nacional de Ensino Médio, a última fase da educação básica no Brasil retirou disciplinas como Filosofia e Sociologia da grade com carga horária mínima obrigatória e inseriu os chamados itinerários formativos. Estes são mais voltados para projetos e devem ser ofertados por área do conhecimento segundo as possibilidades objetivas de cada escola. Dessa forma, estudantes que tiveram contato com práticas de projetos antes de iniciarem o Ensino Médio, caso comum entre alunos de instituições particulares, se sairão melhor.
O Mangue Mania chegou a ser apresentado em dezembro passado ao ex-prefeito de Aracaju, Edvaldo Nogueira (PDT), que assinou um documento viabilizando a implementação do projeto nas escolas municipais da capital. Contudo, com a mudança de gestão, não há garantias de que isso vá acontecer.
Com a aproximação da 30ª Conferência das Partes (COP30), organizada pelas Nações Unidas (ONU) para discutir questões climáticas e a ser realizada em novembro na cidade de Belém, capital do Pará, o grupo de 12 estudantes que pensaram o Mangue Mania pretende organizar visitas a manguezais, gerando o impacto que eles mesmos vivenciaram in loco há poucos meses. Eles também se inscreveram em um programa do Instituto Alana que selecionará projetos para participar da COP30.
Os próximos passos incluem também melhorar a acessibilidade do kit, com a organização de um audiobook e de material todo em braille (hoje, só a cartilha está em braille).