O que você diria se alguém lhe contasse que há em Sergipe um veículo de comunicação profissional que publica todos os dias uma reportagem temática aprofundada, trazendo dados e falas de todos os lados, mas privilegiando vozes que não são ouvidas nas mídias tradicionais?
E se lhe explicassem que esse veículo de comunicação é uma associação sem fins lucrativos formada por jornalistas e comunicadores de diversas realidades sociais e culturais que busca desenvolver narrativas observando essa pluralidade?
O que pensaria ao saber que essa organização sergipana faz jornalismo genuinamente independente, com estatuto que proíbe o recebimento de verbas de publicidade governamental, de empresas privadas, partidos políticos, mandatos parlamentares e organizações religiosas?
Será possível? Será possível fazer jornalismo em Sergipe sem rabo preso e privilegiando a reportagem, a apuração e o compromisso basilar e incontornável com os direitos humanos?
Sim, é possível. Sim, é realidade e ela atende pelo nome de Mangue Jornalismo, um produto do Centro de Estudos em Jornalismo e Cultura Cirigype e que hoje, 19 de abril, Dia dos Povos Indígenas, completa seu primeiro ano de existência, de resistência e de insistência.
Chegamos ao primeiro ano teimando em fazer jornalismo independente e de qualidade.
Quem conhece um pouco a realidade da comunicação em Sergipe deve imaginar o que a Mangue passou nesse primeiro ano.
Infelizmente temos uma longa tradição local de jornalismo aprisionado em razão do financiamento público e privado. Muitas vezes, corretos profissionais de comunicação se veem sem alternativa, obrigados a se sujeitar a essas condições.
O resultado desse processo é que quase não há jornalismo, mas abunda a publicidade em jornais, rádios e canais de TV, tudo travestido de notícia. É algo feito sem maiores apurações ou criticidade, apenas veiculação impositiva da versão oficial em releases.
Assim, a audiência fica refém dessa voz quase única do “jornalismo” governamental, privado, partidário-eleitoral. A sociedade acaba refém desse modelo e pobre de espaços para outras abordagens e discussões diante da realidade.
O Centro de Estudos em Jornalismo e Cultura Cirigype surgiu nesse ambiente, buscando incidir modestamente nesse quadro opressor que forma e deforma a opinião e o interesse público. O esforço desse primeiro ano foi tentar dizer que podemos, sim, fazer jornalismo de alto padrão.
O primeiro produto do Centro Cirigype é exatamente a Mangue Jornalismo, que sobrevive apesar das inúmeras dificuldades, uma experiência que atua na proposição cotidiana de temáticas relevantes, na formação de novos profissionais e na educação social jornalística.
Sobre este último ponto, é preciso deixar bem claro que fazer jornalismo verdadeiramente independente, de profundidade e transparente como a Mangue vem se propondo exige a participação das pessoas como aliadas de toda hora.
A Mangue Jornalismo não é formada por um grupo de voluntários, não é uma organização de abnegados, altruístas. Somos trabalhadores da comunicação e precisamos pagar as contas como quase todo mundo faz. Quem remunera nosso tempo e trabalho na Mangue? Quanto custa fazer uma reportagem, apurar, estudar, entrevistar, escrever?
A nossa necessidade maior pode ser resumida em uma sentença: precisamos de nossas leitoras e leitores. Quando você acessar, ler, comentar ou compartilhar as excelentes e gratuitas reportagens da Mangue Jornalismo, tenha consciência de que alguém ajudou, mesmo que com valor pequeno, a financiar aquela matéria.
Fazer com que parte da sociedade compreenda que não existe jornalismo sem custos, que é preciso que as pessoas se envolvam para além das sugestões de pauta ou comentários é vital para a manutenção do que fazemos. E é muito mais do que apoio financeiro, é participação direta na condução editorial do veículo.
É imprescindível que parte da sociedade compreenda o que de fato é jornalismo, as rigorosas exigências éticas, o compromisso inabalável com a verdade, a vital urgência da apuração. Assim, não existe jornalismo de bastidores, feito com informações soltas, cheio de opinião, achismo e imprecisão. O jornalismo não é negociação de informações.
Nesse primeiro ano da Mangue Jornalismo, as realizações jornalísticas superam o site e suas reportagens. Nos inserimos na realidade da comunicação digital entendendo que ela possui dinâmicas próprias e, portanto, exige atenção e abordagens combinadas.
Fruto desse amadurecimento são os produtos que lançamos além do site: a newsletter Catado da Mangue, um apanhado do que produzimos ao longo da semana anterior; presença no WhatsApp e outras redes sociais; e edição da Revista Paulo Freire, uma publicação mensal político-pedagógica do sindicato dos professores de Sergipe (Sintese).
A Mangue também produziu e publicou em 22 de março, Dia Mundial da Água, um ebook de download gratuito sobre a água como direito humano essencial e que não pode ser privatizada.
Fizemos muito mais do que as nossas pernas permitiriam – e com isso concluímos que há como fazer muito mais. O planejamento do Centro Cirigype para este ano e para os próximos foca em corrigir erros, saldar algumas dívidas e, principalmente, avançar.
Em muito breve lançaremos um novo produto, A Mariscada, o podcast da Mangue Jornalismo. Sem qualquer constrangimento, passaremos o chapéu para que você nos apoie na expansão para plataformas de áudio e vídeo. Seja uma aliada, um aliado da Mangue.
Por fim, é preciso enfatizar que a grande tarefa no ano que passou foi cumprida com sucesso: sobrevivemos, existimos, insistimos e resistirmos, a Mangue continua teimando em fazer jornalismo.
Equipe da Mangue Jornalismo